domingo, 3 de novembro de 2013

Estratégias para Plantio e Revitalização de Igrejas - Ronaldo Lidório

Estratégias para Plantio e Revitalização de Igrejas - Ronaldo Lidório


Estratégias para Plantio e Revitalização de Igrejas
  
Nosso principal alvo neste seminário é a exploração da missiologia a partir da teologia bíblica com destaque nas estratégias que conduzem ao plantio de igrejas. Possuimos 3 objetivos:

·         Expor os fundamentos bíblicos quanto ao plantio de igrejas
·         Expor os elementos estratégicos essenciais no plantio de igrejas
·         Levar os participantes a refletirem sua dinâmica pessoal e ministerial no plantio de igrejas


Introdução

Tessalonicenses 1:5 – Os valores de comunicação do Evangelho

“... o nosso evangelho não chegou até vós tão somente em palavra, mas sobretudo em poder, no Espírito Santo e em plena convicção...”

  • Poder. Deus é a força empoderadora da missão.
  • Espírito Santo. Convence o homem que está perdido e precisa de salvação.
  • Plena convicção (pleroforia). Paulo estava certo da mensagem, do lugar, do tempo e da sua vocação.

Mateus 24: 14 - A necessidade de uma comunicação keygmática (inteligível e aplicável), e ao mesmo tempo martírica (autenticada com o testemunho pessoal).


1.       Contextualização

Missiologia e Teologia não devem ser tratadas como áreas separadas de estudo, mas sim como disciplinas complementares. A Teologia coopera com a Igreja ao fazê-la entender o sentido da Missão e a base para a contextualização do Evangelho. A Missiologia, por outro lado, dirige teólogos para o plano redentivo de Deus e os ajuda a ler as Escrituras sob o pressuposto de que há um propósito para a existência da Igreja no mundo.

Soren Kierkegaard, Willian James e Rudolf Bultmann promoveram o liberalismo teológico associado à contextualização: o universalismo e contextualização como forma de relativização de valores.

O contrapeso teológico e escriturístico veio em Lausanne, 1974.  Se cremos que Deus é o autor da Palavra, que o Evangelho “é o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê” (Rm 1:16), e que “a justiça de Deus se revela no Evangelho” (v.17), entendemos a necessidade de comunicar esta Verdade, de maneira inteligível ao que ouve e teologicamente fiel às Escrituras. Entendemos também que o Evangelho promove mudanças, gera transformações no homem e na sociedade. É a Verdade de Deus que liberta todo aquele que crê.

O Evangelho: a necessidade de uma compreensão bíblica

Uma das maiores barreiras na evangelização é a nossa própria compreensão do Evangelho. Por diferentes motivos humanizamos o Evangelho nas últimas décadas em um processo reducionista e passamos a igualá-lo a nós mesmos. Quando se diz que o Evangelho está crescendo, ou está sofrendo oposição, o que de fato desejamos comunicar é que a “Igreja” está crescendo ou sofrendo oposição. Paulo, escrevendo aos Romanos no primeiro capítulo, porém, deixa bem claro algo que parece estar esquecido em nossos dias: nós não somos o Evangelho – o Evangelho é Jesus Cristo. Portanto, apresentar a Igreja não é evangelizar. Expor a ética cristã para a família não é evangelizar. Anunciar a própria denominação não é evangelizar. Evangelizar é apresentar Jesus Cristo, sua vida, morte e ressurreição, para salvação de todo aquele que crê.

Modelo bíblico de contextualização da mensagem

Observaremos três passagens bíblicas no livro de Atos (9, 13 e 17) nas quais Paulo proclama o Evangelho. Primeiramente a um grupo formado puramente por judeus. Em outra ocasião a judeus, mas com presença gentílica simpatizante ao judaísmo. Por fim para gentios totalmente dissociados do mundo judaico e de seus valores vetero-testamentários. Ficará evidente que Paulo jamais compromete a autenticidade da mensagem bíblica, porém a comunica com aplicabilidade sociocultural de forma que haja boa comunicação, utilizando os elementos necessários para tal.

Notem que aos Judeus Paulo lhes fala sobre o Deus da promessa, Aquele que lhes trouxe do Egito, pois estes conheciam o Deus da Escritura e se viam como os filhos da promessa. Eles entendiam que Deus se revelou a seus pais, que interagiu com seu povo ao longo da história, que lhes deixou as Escrituras.

Ao segundo grupo Paulo lhes fala sobre o Deus das promessas e da história de Israel mas, como havia entre eles gentios, lhes fala também do Messias que há de vir para a salvação de todo aquele que crê. Percebemos aqui neste texto que Paulo lhes apresenta o Evangelho com fortes evidências vetero-testamentárias, para os Judeus, além de um grave apelo moral e escatológico, para os gentios judaizantes.

Ao terceiro grupo, puramente gentílico, o Messias que há de vir não lhes transmitia nenhuma mensagem aplicável à sua história, pois era visto tão somente como o Messias Judeu. Eles não tinham as Escrituras que O revelavam nem as promessas e alianças. Eles não se enxergavam como filhos da promessa  e não se identificavam com Abrão e Moisés. Porém, eles se viam como os filhos da Criação. Possuíam tremenda atração pelas obras criadas e fascinação pela figura do Criador. Eram caçadores de respostas e estudiosos da religiosidade, qualquer religiosidade. Portanto, Paulo lhes pregou sobre o Deus da criação, aquele que era antes de qualquer outro, que detém o poder de fazer surgir, e mantém a humanidade e o cosmos. Ele lhes fala demoradamente sobre os atributos deste Deus que é único, soberano, próximo e perdoador. Finalmente lhes fala de Jesus como o centro do plano salvífico de Deus, apresentando-O como o Messias para toda a humanidade.

A abordagem inicial em cada grupo foi diferente, a partir de seu contexto de compreensão e vida. A exposição foi sempre bíblica, com elementos da Palavra. A finalização, invariavelmente, culminou em Jesus Cristo, sua morte e ressurreição.

Critérios bíblicos para a contextualização

Tippett enfatiza que quando um povo passa a ver Jesus como Senhor pessoal, e não um Cristo estrangeiro; quando eles agem de acordo com valores cristãos aplicados à própria cultura vivendo um Evangelho que faz sentido à sua cosmovisão; quando eles adoram ao Senhor de acordo com critérios que eles entendem, então teremos ali uma igreja entre eles.

Na tentativa de avaliar a compreensão (e transformação) do Evangelho em um contexto transcultural, ou mesmo socialmente distinto, há três principais questões que deveríamos tentar responder perante um cenário onde o mesmo já foi pregado:

a) Eles percebem o Evangelho como sendo uma mensagem relevante em seu próprio universo?
b) Eles entendem os princípios cristãos em relação à cosmovisão local?
c) Eles aplicam os valores do Evangelho como respostas para os seus conflitos diários de vida?

Contextualizar o Evangelho é traduzi-lo de tal forma que o senhorio de Cristo não será apenas um princípio abstrato ou mera doutrina importada, mas sim um fator determinante de vida em toda sua dimensão e critério básico em relação aos valores culturais que formam a substância com a qual experimentamos o existir humano.


2.       Uma breve retrospectiva histórica e metodológica

Em meados do século 19 Henry Venn e Rufus Anderson direcionaram a Igreja através de sua intencionalidade no plantio de igrejas, justificando que as mesmas deveriam, ao ser plantadas, ter três características básicas: serem auto-propagáveis, auto-governáveis e auto-sustentáveis. Era o desenvolvimento do conceito de plantio de igrejas autóctones.

Na segunda metade do século 19, o esforço missionário denominacional combinou o plantio de igrejas com o desenvolvimento social quando foi contruído um número expressivo de hospitais, escolas e orfanatos em todo o mundo.

Hibbert observa, assim, que no início dos anos 80 havia três principais tendências quanto à ênfase no plantio de igrejas. McGravan e Winter enfatizavam o evangelismo e crescimento de igrejas; John Stott e outros enfatizavam uma abordagem holística conhecida hoje como missão integral; Samuel Escobar eRené Padilha adotaram um foco mais direcionado na justiça social.

Encontramos hoje uma vasta proliferação de modelos de plantio e crescimento de igrejas tais de como de Garrison, Vineyard, Willow Creek, Ralph Neighbor, Charles Brok, Brian Woodford e muitos outros. Quase todos possuem três ênfases semelhantes: a) plantio de igrejas de forma
intencional e planejada; b) a rápida incorporação dos novos convertidos à vida diária da igreja; c) ênfase no treinamento de liderança local e comunidades auto-governáveis.

Observando os diversos segmentos de plantação de igrejas no mundo atual (e na força missionária brasileira), podemos perceber que o enraizamento dos problemas mais comuns:

a) A dificuldade de se distinguir igreja e templo, perdendo assim o valor do discipulado e gerando mais investimento na estrutura do que em pessoas.

b) A demora na introdução dos convertidos na vida diária da Igreja, diluindo assim o valor da comunhão e integração, além de gerar crentes imaturos e disfuncionais.

c) A despreocupação com os fundamentos teológicos e atração pelos mecanismos puramente pragmáticos.

d) A ausência de sensibilidade social e cultural, pregando um evangelho sem sentido para o contexto receptor. Uma mensagem alienada da realidade da vida.

e) A excessiva pressa no plantio de igrejas, gerando comunidades superficiais na Palavra e abrindo oportunidades reais para o sincretismo ou nominalismo.

f) O excessivo envolvimento com a estrutura da missão ou da igreja, desgastando pessoas, recursos e tempo, e minimizando o que deveria ser o maior e mais amplo investimento: a proclamação do Evangelho.


3.                O modelo Paulino de plantio de igrejas

Pensemos na estratégia de Paulo. Em Antioquia da Pisídia ele pregava na Sinagoga, aos judeus. Eles, impressionados, o convidou a regressar. (At. 13:13-48). Percebe-se que em Icônio o Evangelho não foi rapidamente aceito, mas Deus o usou manifestando Sua graça por meio de milagres e maravilhas (At. 14:1-4). Em Listra Paulo foi usado por Deus para a cura de um homem, e transformou este momento em uma oportunidade para pregar o Evangelho à uma grande multidão (At. 14: 8-18). Em Tessalônica Paulo pregava na Sinagoga durante os sábados e na praça durante a semana. Historicamente ele se postava na “petros”, um suporte de pedra à saída do mercado, para ali anunciar diariamente a palavra do Senhor. (At. 17: 1-14).

Portanto encontramos no ministério de um só homem, em uma mesma geração, diferentes abordagens e estratégias. Paulo fala a multidões, mas também visita de casa em casa. Ele prega aos judeus na sinagoga, mas também o faz fora da sinagoga. Utiliza praças e mercados, jamais deixando de proclamar às multidões. Ele também devota-se a indivíduos para discípula-los e treiná-los para a liderança local. Devemos, portanto, compreender que não há estratégias fixas para a proclamação do Evangelho. Apenas princípios fixos.

No modelo Paulino de plantio de igrejas podemos observar que as principais estratégias utilizadas foram:

  • Introduzir-se na sociedade local a partir de uma pessoa receptiva ou um grupo aberto a recebê-lo e ouvi-lo.
  • Identificar ali o melhor ambiente para a pregação do evangelho, seja público como uma praça ou privado como um lar.
  • Evangelizar de forma abundante e intencional, a partir da Criação ou da Promessa, sempre desembocando em Cristo, sua cruz e ressurreição.
  • Expor a Palavra, sobretudo a Palavra. Expor de tal forma que seja ela inteligível e aplicável para quem ouve.
  • Testemunhar do que Cristo fez em sua vida.
  • Incorporar rapidamente os novos convertidos à igreja, à comunhão dos santos, seja em uma casa ou um agrupamento maior.
  • Identificar líderes em potencial e investir neles, seja face a face ou por cartas.
  • Não se distanciar demais das igrejas plantadas, visitando-as e se comunicando com as mesmas, investindo no ensino da Palavra.
  • Orar pelos irmãos, pelas igrejas plantadas e pelos gentios ainda sem Cristo, levando as igrejas também a orar.
  • Administrar as críticas e competitividade sem permitir que tais atos lhe retirem do foco evangelístico.
  • Utilizar a força leiga e local para o enraizamento e serviço da igreja.
  • Investir no ardor missionário e responsabilidade evangelística das igrejas plantadas.


4.                Plantio de Igrejas -  Elementos Essenciais

Os valores que devem fundamentar um processo amplo de plantio de igrejas são diversos, mas mencionaremos os principais:

  • Oração.   Há clara ligação entre despertamento para oração e plantio de igrejas;  entre avivamentos históricos e avanços missionários. Patrick Johnstone: “Quando o homem trabalha, o homem trabalha. Quando o homem ora, Deus trabalha”.

  • Abundante evangelização. Nenhuma tecnologia missionária substitui o poder da comunicação pessoal do Evangelho. O Evangelho foi abundantemente comunicado em cada período de expansão e plantio de igrejas de forma pessoal, fiel e constante.

  • Intencionalidade e objetidade. A ausência de uma intenção clara e objetiva de plantar igrejas é, em si, talvez a maior barreira para que isto venha a acontecer. Hesselgrave afirma que 75% das igrejas plantadas em lugares onde não há igrejas nasceram a partir de ações intencionais.

  • Fidelidade à Palavra.  Há muitas estratégias de movimento de massa que são funcionais, entretanto não são bíblicas. David Hesselgrave alerta-nos dizendo que  “nem todo novo pensamento é dirigido pelo Espírito. Nem tudo o que é novo é necessariamente bom. A Bíblia é antiga, o Evangelho é antigo e a Grande Comissão é antiga...”.  

  • Liderança local. Todo amplo movimento de plantio de igrejas que tornou-se regionalmente duradouro contou com um forte envolvimento de pessoas locais desde a primeira fase. O investimento em pessoas locais, passando-lhes a visão, paixão e estratégias garantirá um processo de plantio de igrejas que vá além do missionário ou evangelista.

  • DNA multiplicador. A reprodução de igrejas plantadas em uma segunda fase deve ser feita por meio dos frutos e não da raiz do movimento. Nesta etapa o(s) missionário(s) devem estar já assumindo uma posição de supervisão da visão e encorajamento, e não de linha de frente. Igrejas devem plantar igrejas. O modelo missionário que sugiro é: Inicie, pregue, discipule, reproduza, assista, encoraja e parta.


5.                Plantio de igrejas – Principais Barreiras na dinâmica ministerial

Os principais inimigos da evangelização e plantio de igreja em contexto intercultural são:

·         Falta de foco: múltiplas, pequenas e secundárias atividades que consomem todo o tempo e drenam toda a energia.
·         Falta de disciplina: A necessidade da organização e disciplina para um bom uso do tempo.
·         Falta de estratégias: a limitação de um trabalho puramente intuitivo. A abundância e  persistência como elementos centrais na evangelização e plantio de igrejas.
·         Falta de conciliação com as coisas da vida: a necessidade de conciliação das “coisas da vida” com o ministério missionário.
·         Falta de recursos financeiros: a grande demanda de recursos ao longo dos anos e a necessidade de planejamento, priorização e sacrifício.
·         Falta de motivaçãoEstar no local errado; permanecer tempo demais sem se mover para uma nova etapa; problemas relacionais dentro ou fora da equipe; falta de sincronia motivacional no casal; Isolamento e saudosismo nos solteiros.
·         Falta de comunhão com Deus: A vida devocional como fundamento para a vida e o ministério.
·         Falta de encorajamento e pastoreio: A ausência de prestação de contas, bem como a ausência de pastoreio resultam em isolamento, paralização ou distorções.

Algumas soluções e boas iniciativas:

·         Vida com Deus: fonte geradora de motivação, paz e direção no ministério.
·         Cuidar do coração, do casamento e/ou  família. É necessário estar bem para trabalhar bem.
·         Ser proativo procurando ajudar mais do que espera ser ajudado.
·         Ser um simplificador dos problemas que lhe chegam.
·         Procurar ajudar sempre que detectar um problema crônico ou difícil.
·         Ter um foco claro, simples e viável em seu ministério.
·         Escolher suas lutas. Não são todas.
·         Investir na comunicação com irmãos e igrejas para boa cobertura de oração e também apoio ministerial.
·         Investir na comunicação na equipe para boa amizade, oração e apoio ministerial.
·         Corrigir os caminhos errados. É sempre possível recomeçar: novos alvos, novo relacionamento, nova motivação, nova disciplina, nova organização, novo coração.


TRABALHOS CITADOS

BOSCH, David J. 1983. The structure of mission: An exposition of Matthew 28:1-20. Em Exploring church growth, Ed. WILBERT R. Shenk, 218-248. Grand Rapids, MI: Eerdmans.

---------------. 1991. Transforming mission: Paradigm shifts in theology of mission. Maryknoll, New York. Orbis.

CLOUD, Henry and John Townsend. 2001. How people grow. Zondervan – Grand Rapids.

GARRISON, David. 1999. Church Planting Movements. Richmond.  International Mission Board of the Southern Baptist Convention

GRUBB,Norman. 2003, new edition. C.T.Studd: Cricketer and Pioneer. Lutterworth Press

HESSELGRAVE, David. 1980. Planting churches cross-culturally: A guide to home and foreign missions. Grand Rapids, MI: Eerdmans.

---------------. 1984. Plantar IgrejasEdições Vida Nova, São Paulo.

HIBBERT, Richard. 2005. Paper: A survey and evaluation of contemporary evangelical theological perspectives on church planting.

HIEBERT, Paul G. and Hiebert Meneses, Eloise. 1996. International Ministry:  Planting Churches in Band, Tribal, Peasant, and Urban Societies. Grand Rapids, MI: Baker Book House.

JOHNSTONE, Patrick. 1998. The church is bigger than you think. Fearn, UK: Christian Focus

LIDÓRIO, Ronaldo. 2006. Com a mão no aradoVenda Nova. Editora Betânia.

---------------. 2008. Plantando igrejas. São Paulo: Editora Cultura Cristã.

LOPES, Augustus. 2004. A Bíblia e seus interpretes. São Paulo. Editora Cultura Cristã.

McGRAVAN, Donald. 1980. Reaching People Through New Congregations - Church Growth Strategies That Work. Nashville, TN. Abingdon Press.

MACCHIA, Stephen. 1956. Becoming a health church. Baker Books – Grand Rapids.

MALPHURS, Aubrey. 1998. Planting growing churches for the 21st century. Grand Rapids, MI. Baker.

MURRAY, Stuart. 1998. Church planting: Laying foundations. Carlisle, Cumbria. Paternoster.

NICHOLLS, Bruce J. 1983. Contextualização: Uma Teologia do evangelho e Cultura. Trad.: Gordon Chown. São Paulo: Sociedade Religiosa Edições Vida Nova.

RAMOS, Ariovaldo. 2003. Nossa Igreja Brasileira. Editora Hagnos.
REILFLER, Hans Ulrich. 2003. Antropologia Missionária para o século XXI.Londrina. Editora  Descoberta.

STOTT, John. 1981. The Living God is a Missionary God. Em Perspectives on the World Christian Movement. Ed. Ralph Winter and Steven Hawthorne, Pasadena: William Carey Library.

TIPPETT, Alan. 1987. Introduction to missology. Pasadena, CA. William Carey Library.

VAN ENGEN, Charles. 1999. Footprints of God: A Narrative Theology of Mission. Monrovia, CA.

VERKUYL, J. 1978. Contemporary missiology: An introduction. Grand Rapids, MI. Eerdmans.

WOODFORD, Brian. 1997. One church, many churches: A five-model approach to church planting and evaluation. WEC Press.

domingo, 20 de outubro de 2013

O Homem prudente



Introdução:

São cinco livros na bíblia considerados sapiençais, ou livros de sabedoria. Eles não estão falando dos “diversos caminhos” para ir ao céu, mas seu desejo é nos ensinar a viver na terra. Princípios não são para você ir para o céu, antes, para não transformar sua vida num inferno. Para ir para o céu, o único caminho é a graça suficiente de Deus, providenciada na cruz do calvário, por meio do sangue do Cordeiro. Por isto Jesus afirmou: “Eu sou o caminho, a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim”. O caminho para o céu é exclusivo pela mediação do sacrifício de Cristo. “Não há outro mediador entre Deus e os homens, a não ser, Cristo Jesus, homem” (1 Tm 2.15).
Em Ec 7.29 lemos: “Eis o que tão somente achei, Deus fez o homem reto, mas ele se meteu em muitas astucias”. No seu conhecido seminário “Conflitos da vida”, Larry Coy afirma: “A vida é essencialmente simples, mas nós a complicamos com nossos pecados. A verdade é que nossos desvios e pecados transtornam nossa existência.

O Livro de provérbios fala muito do homem insensato (louco), e do homem sábio (sempre se relacionando à prudência). Prudência é essencial para que vivamos vida abundante e rica.

O que é prudência?

É a habilidade de se antecipar ao perigo, de perceber onde estão as áreas de risco. O livro de provérbios ensina muito sobre este assunto:
ü       O imprudente não percebe os riscos de sua atitude– “Quem é simples, volte-se para cá. E aos faltos de entendimento ela diz: As águas roubadas são doces, e o pão tomado às escondidas é agradável” (Pv 9.16-17).
ü       O imprudente não reflete sobre suas decisões. “Assim como não é bom ficar a alma sem conhecimento, peca aquele que se apressa com seus pés” (Pv 19.2). Veja o simples como ele se enrola
ü       O homem prudente não fala demais -  “O homem prudente oculta o conhecimento” (Pv 12.23 e 14.33).
ü       Norteia sua vida sobre bons fundamentos “Todo prudente procede com conhecimento” (Pv 13.16)
ü        O Simples é o ingênuo. Ele dá credito a toda palavra, mas o prudente atenta para seus passos (Pv 14.15,16,18). Os simples herdam a estultícia.
ü       Pv 22.3; 27.12  – “O prudente vê o mal e se esconde, mas os simples passam adiante e sofrem a pena”. Simples como a pomba, prudente como a serpente. “No juízo não sejais meninos; na malicia, sim” (1 Co 14.20).
ü       Deus convida o simples a se aproximar dele (Pv 9.4). Da mesma forma procede o mal (Pv 9.13-16).
ü       O simples só aprende por meio da pancada e sofrimento. “açoita o escarnecedor, e o simples tomará aviso; repreende ao entendido, e aprenderá conhecimento (Pv 19.25).
ü       O prudente pede conselhos, examina as questões, antes de tomar atitudes. “Com conselhos prudentes tu farás a guerra; e há vitória na multidão dos conselheiros” (Pv 24.6). Compare com Lc 14.28-32

Conclusão:

Exemplo clássico do homem ingênuo: Este texto nos fala do simples no seu envolvimento com a mulher adultera (Pv 7.22-23). Croft afirma que o ingênuo é um T.E.T – “Tolo em treinamento”, e sugere que façamos uma escala para analisar em qual nível estamos na nossa estultice.

Escala: Em qual estágio você se encontra?
Tolo (insensato)                               Ingênuo                               Sábio
          1                                         5                                         10

Tolo ou sábio?

Questões para reflexão:
  1. Como isto se aplica à minha vida?
  2. Como isto reverbera na minha família?
  3. Como as atitudes impactam gerações?
                       Pv 11.29: “Quem perturba a casa herda o vento”
                       Pv 13.22: “O homem de bem deixa herança aos filhos de seus filhos”.
                      

Aos necessitados de Sabedoria:
Deus sabe que precisamos de sabedoria, para tomar decisões maduras e sensatas. O apóstolo Tiago, iluminado pelo Espírito Santo afirma: “Se algum de vós tem falta de sabedoria, peça-a Deus, que a todos dá liberalmente, e nada impedirá a benção, e ser-lhe-á concedida” (Tg 1.4)
A maior benção da vida é a sabedoria. Você a tem encontrado?


segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Deus fala pouco...


Ao ver tantos homens se arvorarem hoje, falando em nome de Deus, profetizando, prenunciando uma suposta comunicação com o Eterno, eu me assusto muito, porque ao ler criteriosamente a Bíblia percebo que mesmo nos tempos bíblicos, Deus não fala muito...
Nos dias de Samuel, tempos de intensas manifestações proféticas, houve dias de escassez: “Naqueles dias, a Palavra do Senhor era mui rara; as visões não eram frequentes” (1 Sm 3.1). Deus, muitas vezes, de forma intencional, se silencia em razão dos seus decretos e propósitos.
A palavra de Deus para alguns profetas é tão especifica e excepcional, que fazem questão de dar e relatar o ambiente histórico e político: “Aconteceu no trigésimo ano, no quinta dia, do quarto mês, que estando eu no meio dos exilados, junto ao rio Quebar, se abriram os céus e tive visões de Deus” (Ez 1.1). O impacto da revelação de Deus foi tão forte, deixou marcas tão profundas que ele faz questão de registrar o dia, o mês e o ano e o local.  Ao continuarmos a leitura vemos o seguinte: “No quinto dia do referido mês, no quinto ano de cativeiro do rei Joaquim, veio expressamente a palavra de Deus, a Ezequiel, filho de Buzi, o sacerdote na terra dos caldeus, junto ao rio Quebar, e ali esteve sobre ele a mão do Senhor” (Ez 1.2-3). Por ser algo tão maravilhoso e tremendo, ele faz questão de demonstrar o contexto político e as condições em que estavam vivendo. A palavra de Deus é muito séria.
O comentário da Bíblia Vida Nova afirma: “Ezequiel começou seu ministério publico quando uma boa parte de Judá estava em cativeiro em Babilonia, antes da destruição da cidade de Jerusalém... depois da queda em 597 a.C., o povo de Judá reconheceu, tarde demais, que havia merecido o castigo final... o livro começa com uma data internacional, o trigésimo ano do império da Babilonia, que começou com a dinastia de Nabupolassar (626-605 a.C. este levou apenas cinco anos para acrescentar à antiga cidade de Babel os territórios ao redor, forçando os Assírios a recuar para seu próprio país. Se Ezequiel está usando esta data, 621 a.C. para inicio do novo império, estamos no ano 593 a.C., vs. 2. Quebar era um grande canal que irrigava a parte oriental da cidade da Babilonia, é provável que os cativos estavam sendo usados para completar a construção deste rio artificial”. 
A próxima revelação que o profeta recebe só acontece um ano depois. “No quinto dia do sexto mês do sexto ano do exílio, eu e as autoridades de Judá estávamos sentados em minha casa quando a mão do Soberano Senhor veio ali sobre mim” (Ez 8.1). “No sexto ano”. 592 a.C.,, era quase um ano depois da visão inicial.
A próxima série de revelações inicia-se no capítulo 20. “No décimo dia do quinto mês do sétimo ano do exílio, alguns dos líderes de Israel vieram consultar o Senhor, e se sentaram diante de mim. Então me veio esta palavra do Senhor” (Ez 20.1,2). Trata-se do ano 591 a.C, um ano e um mês depois dos outros relatos narrados a partir de Ez 8.1.
Talvez o mais conhecido tempo da história sem revelação reconhecida como canônica ou inspirada, tenha se dado entre o livro de Malaquias, e o primeiro livro do Novo Testamento que foi escrito. Os historiadores falam do “período intertestamentário”, ou “período do silêncio de Deus”. A tradição reformada e evangélica não reconhece qualquer texto inspirado durante este período de 430 anos. Na verdade, teólogos admitem a possibilidade de que Deus pode ter falado neste período, mas não reconhecem nenhum livro canônico neste período.

Por que Deus fala pouco?

A razão mais direta é porque Deus vela pela sua palavra: “Ainda veio a mim a palavra do Senhor, dizendo: Que é que vês, Jeremias? E eu disse: Vejo uma vara de amendoeira.
E disse-me o Senhor: Viste bem; porque eu velo sobre a minha palavra para cumpri-la” (Jr 1.11,12). Afinal, “Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem, para que se arrependa. Porventura, tendo ele dito, não o fará? ou, havendo falado, não o cumprirá?” (Nm 23.19). Quando ele afirmar algo, fizer alguma declaração, sua palavra inexoravelmente vai se cumprir, e não há força no céu e na terra que possa impedir que ela se realize.
O Rev. Wilson de Souza, que durante muitos anos foi pastor da 8ª Igreja de Belo Horizonte, diante de pensamentos liberais, fez certa feita a seguinte declaração dialética: “Se Deus não disse o que teria dito, porque não disse o que teria de dizer?”. Sua palavra é fogo, é martelo que esmiúça a penha (Jr 23.29).

Pouco, mas suficiente...

Apesar de falar pouco, a Bíblia nos ensina que Deus sempre se revelou na história, afinal, ele não é um poder frio e silencioso. “No passado ele permitiu que todas as nações seguissem os seus próprios caminhos. Contudo, não ficou sem testemunho: mostrou sua bondade, dando-lhes chuva do céu e colheitas no tempo certo, concedendo-lhes sustento com fartura e enchendo de alegria os seus corações". (At 14,16,17). Apesar de falar pouco, não é ausente.
O que Deus fala, é suficiente. Embora a bíblia não esgote todos os assuntos, e não seja exaustiva em todos os temas; naquilo que ela faz afirmações, podemos confiar, afinal, Jesus declarou que aquele que nele crê, nunca será envergonhado, e jamais será confundido.
Quando Jesus relatou a história do rico e de Lázaro, o rico, ao ver-se na condição de julgamento e de tormento suplica: “Ele respondeu: ‘Então eu lhe suplico, pai: manda Lázaro ir à casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos. Deixa que ele os avise, a fim de que eles não venham também para este lugar de tormento’. "Abraão respondeu: ‘Eles têm Moisés e os Profetas; que os ouçam’. ‘Não, pai Abraão’, disse ele, ‘mas se alguém dentre os mortos fosse até eles, eles se arrependeriam’. Abraão respondeu: ‘Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco se deixarão convencer, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos’". (Lc 16.27-31).
O autor da carta aos hebreus é bem objetivo quanto a esta questão: “Há muito tempo Deus falou muitas vezes e de várias maneiras aos nossos antepassados por meio dos profetas,
mas nestes últimos dias falou-nos por meio do Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas e por meio de quem fez o universo” (
Hb 1.1-2).
Deus falou “muitas vezes”, e de “muitas maneiras”, mas ele fala apenas aquilo que é suficiente para nossa salvação. Deus não se deixa enredar por especulações, filosofias e vãs sutilezas ou questiúnculas banais que só servem para afagar o ego de pensadores narcisistas.
Certa vez participei da cerimônia de psso de um prefeito evangélico. Em dado momento, um pastor pediu para dar um testemunho. Ele disse que Deus lhe havia falado que aquele irmão seria eleito. Convencido disto, “profetizou” sua eleição diante de sua igreja e amigos, presumindo que Deus lhe havia falado. Depois de sua “profecia”, porém, as pesquisas eleitorais começaram a apontar o fato de que a candidatura daquele irmão começou a despencar, e este pastor que teria recebido a palavra de Deus, disse que foi orar e disse: “Senhor, não permita que a honra e a reputação de teu servo seja jogada no lixo. Honra o teu servo!”. Aquele prefeito eventualmente foi eleito.
Ouvindo e refletindo, contudo, sobre este “testemunho”, percebi algumas coisas muito complexas:
  1. Este irmão não precisava temer, de Deus de fato falou, porque quando ele fala, o cumprimento não se dá em razão das coisas favoráveis ou não;
  2. Este irmão não precisava temer sua reputação, porque o que estava em honra não era esta questão, mas sim a glória de Deus. Afinal, que Deus é este que fala e sua palavra não se cumpre? Deveríamos temer ou confiar num Deus deste?

Conclusão:


Deus fala pouco! Mas o que fala é suficiente para nos tornar sábios para a salvação. Deus aparentemente se silencia nos dias maus, e eventualmente desejaríamos ouvir mais dele, saber qual é sua vontade e que atitude tomar, mas não precisamos. Deus age por princípios que ele mesmo estabeleceu, e pela palavra que ele proferiu. Diante da sua palavra, devemos agir com santa submissão e obediência e podemos descansar plenamente e devemos confiar inteiramente na sua direção. E quando ele falar, quando quiser, e se o quiser fazer, sua palavra que é fogo e martelo, nunca voltará vazia, mas fará tudo aquilo que apraz aos seus santos decretos e propósitos, afinal, “os dons e a vocação de Deus, são irrevogáveis”(Rm 11.29). 

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

O Mal




Uma Introdução à questão do Mal

Scott Peck, psiquiatra cristão, faz uma pergunta intrigante que incomoda o mundo científico: "O mal existe?" Esta pergunta se reveste de um significado ainda maior ao percebermos que esta questão não foi elaborada por um teólogo, mas procede de um homem da ciência, que lida com a alma humana. Peck é um admirável escritor americano, com livros que já venderam mais de 7 milhões de exemplares, como “A Trilha menos percorrida”, mas esta questão é formulada num livro menos conhecido com o intrigante título de “O Povo da mentira. A esperança para a cura do mal”.
A questão do mal, é para ele, antes de tudo, esta questão é intelectual: "Existe esta coisa chamada de mal espírito, o mal de forma pessoal?"[1] Ele afirma que quando começou a fazer esta pergunta, de forma orgulhosa e aberta, não admitia que sua resposta pudesse ser positiva, mas depois de acompanhar dois pacientes no seu consultório, ele começou a considerar seriamente tal possibilidade. Após ler muito material sobre assunto, a maioria simplista, ingênua ou sensacional, encontrou também alguns poucos autores que pareciam genuínos e que deveriam ser levados em consideração. Andando com um grupo de pessoas cristãs que tratavam de pessoas com tais sintomas, acompanhou dois casos de possessão satânica, e concluiu sua análise com a seguinte afirmação: "Eu agora sabia que Satanás é real. Eu o havia encontrado"[2].
Martin Buber, brilhante pensador judeu escreveu um livro só para tratar da questão do mal, “Good and evil” no qual aborda as complexas dinâmicas de processos destrutivos. Já na introdução faz intrigantes perguntas: “Por que o mal é tão poderoso?” e ainda “Qual é a origem do mal?”. Na abordagem que faz, elabora suas conceituações a partir da manifestação do mal no Antigo Testamento, caminhando na mitologia do mundo antigo, e discutindo questão da árvore do conhecimento no Éden, a figura de Caim e sua escolha, as imaginações e impulsos que brotavam nas relações humanas, os elementos primais da alma, para concluir que “as imagens de bem e mal que interpreto aqui, correspondem, como temos visto, a certas apreensões antropológicas que ocorreram na caminhada histórica do ser humano”[3]
Recentemente foi lançado no Brasil o livro “O Efeito Lúcifer”[4], de Philip Zimbardo, que nos anos 80 dedicou boa parte de sua pesquisa como psicólogo, na Universidade Stanford, para entender os motivos que levam as pessoas a praticar o mal. Para entender melhor as complexas relações destas questões, fez um experimento isolando e dividindo um grupo de estudantes, pelo período de 30 dias, para viver num ambiente imaginário de uma prisão, dividindo-os entre guardas e prisioneiros. Seu experimento teve que ser interrompido, porque ele constatou os maus-tratos de uns e a submissão de outros que extrapolaram os limites, dentro deste ambiente. Vendo a situação saindo do controle, ele pôs um fim na pesquisa.
Para Zimbardo, o mal está no caráter e na personalidade, tendo suas raízes na própria natureza humana, e que as pessoas ao serem submetidas a forte pressão  dificilmente é capaz de se manter no espectro do bem. “O inesperado por despertar no ser humano reações completamente contrárias a tudo aquilo em que acredita, fazendo emergir uma face bastante cruel”[5]. No caso do holocausto judeu na II Guerra Mundial, ele afirma que o ingrediente essencial dessa engrenagem foi a desumanização das vítimas, e quando isto acontece, o mal se trivializa. Para ele, as penitenciárias jamais serão capazes de reabilitar quem já praticou atos de crueldade, contituindo-se num grande fracasso multibilionário, e que a melhor vacina contra a prática do mal é o exercício permanente da autocrítica.
Numa palestra proferida na Harvard University em 2001, o Dr Billy Graham, falou sobre os grandes mistérios que ainda perduram na humanidade apesar de sua conquista tecnológica: são os problemas espirituais que só podem ser resolvidos com respostas morais e espirituais, e destacou um deles, O problema do Mal. Ele cita particularmente o século XX. Como explicar que apesar do grande avanço da ciência e da tecnologia, duas grandes guerras mundiais tenham eclodido num período moderno no curto espaço de 30 anos? Como entender o genocídio praticado em guerras tribais e imperialistas ainda em nossos dias? Que resposta podemos dar para um mundo tão contraditório e repleto de tragédias com terremotos e tsunamis? Como explicar o mal que tem em seu poder a capacidade de mudar o rumo da história e dos sonhos da humanidade e de nossas vidas particulares com um crime hediondo ou a morte trágica de um ente querido ainda na sua juventude, vitima de uma doença congênita ou adquirida?
A cosmologia da antiguidade era permeada por uma concepção da presença do mal, e o diabo era visto como alguém concreto e pessoal. O mundo antigo cria em demônios e coisas malignas. O grande historiador alemão, Adolf Von Harnack, falando da compreensão do primeiro século acerca deste assunto, afirma que “todo o mundo de então, e a atmosfera em que viviam era cheia de demônios; não apenas ídolos, mas cada fase e forma de vida era regida por eles. Eles se assentavam em tronos, se moviam entre as lamparinas. A terra era literalmente um inferno”. [6]
Mas será que esta concepção também se aplica ao mundo secularizado de hoje?
O mistério do Mal
"Deus, soberanamente bom, não permitiria de modo algum a existência de qualquer mal em suas obras, se não fosse poderoso e bom a tal ponto de poder fazer o bem a partir do próprio mal".
Santo Agostinho
A questão do mal é um grande desafio filosófico para pensadores cristãos ou ateus. Os ateus acham que a existência do mal nega a existência de Deus. Para o cristão o problema do mal é posto de maneira complexa. Muitos fazem perguntas para tentar embaraçar os cristãos. Por que existe o mal se há um Deus? Por que Deus não faz nada para acabar com o mal? Se Deus é bom, porque permite a existência do mal?
Homens de Deus reconhecem o problema do mal:
èPor que se concede luz ao homem, cujo caminho é oculto, e a quem Deus cercou de todos os lados?" (Jó 3:23)
Davi è "Não têm conta os males que me cercam" (Salmo 40:12).
Paulo è "Toda a criação a um só tempo geme e suporta angústias até agora" (Romanos 8:22).
Para Lewis, “existem dois erros iguais e opostos quando se discute a questão dos demônios. Um é a descrença na sua existência. O outro é crer e sentir um interesse excessivo e patológico sobre eles. Os demônios de deleitam em ambos os erros, tanto na visão materialista quanto na mágica”[7]

O Surgimento do Mal
Apesar do mal ser uma realidade em nosso mundo, as Escrituras deixam claro que Deus não criou o mundo no atual estado em que se encontra. O mal veio como resultante da queda do homem. A Bíblia diz que Deus é amor e Ele criou a raça humana para que O amasse. Ao permitir que o homem e a mulher pudessem escolher entre o bem e o mal, o mal se tornou real. Ao desobedecer a Deus, Adão e Eva não escolheram algo que Deus criou, mas por sua livre escolha, eles trouxeram o mal para nosso mundo. Foi o egoísmo do homem que trouxe o mal para o mundo. Mas isto também revela que o Mal já existia como possibilidade no mundo.A Queda não inventou o mal, mas o evidenciou. Após a queda, o mundo foi afetado no seu eixo central, e as coisas não estão como deveriam estar. O Pecado trouxe problemas nos relacionamentos: Do homem com Deus (separação, fuga, medo), consigo mesmo (desequilíbrio emocional, culpa, angústia), com o próximo (acusação e manipulação)  e a natureza (Maldição - até a natureza e os animais às vezes são inimigos do homem). Surgem também as guerras e doenças. O perfeição da criação foi desfeita pelo pecado. Embora a Bíblia não nos informe porque Deus permitiu o mal, ela tão somente nos mostra como e porque o mal entrou no mundo. Deus é infinitamente sábio e os seus propósitos estão além da nossa compreensão.
A Bíblia nos ensina que o universo foi criado de forma perfeita e harmoniosa, e que Deus considerou que tudo que havia feito era muito bom, mas o pecado entrou no mundo por causa do orgulho, rebeldia e das escolhas morais feitas pelo homem. A dor e o mal vieram como conseqüência, não faziam parte do plano original de Deus. “Deus fez o homem reto, mas ele se meteu em muitas astúcias” (Ec 7.29).
O mal, a dor e a morte não faziam parte do propósito original de Deus, mas são resultantes de conflitos morais e decisões erradas do ser humano. Se formos honestos, veremos que muitos dos males que sofremos resultam de nossa atitude tola nas escolhas que fazemos e nas prioridades erradas que damos à nossa vida.
Jesus, contudo, não considerou o sofrimento de uma forma normal. Muitas vezes se sentiu indignado e entristecido diante do desprezo humano em relação à vida. Por duas vezes tentou tirar dos discípulos uma cosmovisão equivocada e cultural que associava a dor a um pecado específico (Lc 13.1-5; Jo 9.1-4). Ao ministrar sobre este assunto, deixou claro que, o mal, nem sempre, é resultado de escolhas morais. Ele considerou o mal como algo anormal, e por isto não aceitou resignadamente a brutalidade e violência da vida. Chorou diante da morte, reagiu diante de atitudes de lideranças que impunham sofrimento aos seus liderados, curou leprosos, cegos e coxos, conspirando contra a angústia presente na vida humana.
A dor, o mal e a morte ainda continuam sendo filosoficamente desafiadores, às vezes ficamos perplexos diante de notícias estarrecedoras.
Não podemos justificar o problema do mal afirmando que foi Deus quem decretou o pecado. Se Deus tivesse decretado todas as coisas, Ele seria o autor do pecado e do mal e isto não está de acordo com o que a Bíblia diz.

A Banalização do Mal

Um dos dilemas mais complexos que eventualmente se insere numa cultura é a perda da referência ética que torna o mal trivial. Alguns teóricos acreditam que isto se dá na medida em que o mal vai se tornando institucionalizado, cultural e corporativo, desembocando num processo endêmico na sociedade.
A filósofa Hannah Arendt levantou esta problemática ao elaborar uma questão fundamental no campo do conhecimento humano: “Como é que de repente todo mundo faz aquilo que considera errado?”. Ela fez esta pergunta ao estudar o nazismo e tentar entender como uma população inteira aderiu à loucura de Hitler.
Não apenas o povo simples aderiu ao sonho e a utopia do III Reich, mas pessoas de bem, intelectuais e religiosos. Existe um episódio que demonstra isto de forma clara: buscando encontrar apoio das igrejas e de sua liderança, Hitler reuniu os clérigos mais importantes do país numa convenção para 3000 sacerdotes. Em seu discurso teria afirmado o seguinte: “vocês cuidem dos céus, e eu cuido da terra”, recebendo apoio de uma grande maioria. Apenas uma parte, encabeçada por Dietrich Bonhoeffer e Henry Niemüller, fez oposição ao projeto de Hitler e recusou a oferta do ditador fundando o movimento conhecido como “Igreja Confessante”, cujo objetivo era despojar Hitler do poder. Bonhoeffer foi executado na cadeia, uma semana antes da queda do Nazismo, somando-se ao imenso número de mártires cristãos no Século XX.
Para Arendt, essa adesão foi provocada pelo que chamou de “banalização do mal”.
Naturalmente, conceitos de bem e de mal mudam de acordo com culturas, épocas, gerações, mas quando o mal se torna banal em qualquer momento da história, ele impede que as pessoas julguem eticamente os fatos e dificulta o discernimento entre o lícito e o ilícito. Neste caso ocorre uma confusão de valores. O mal torna-se bem, e o bem mal, as trevas transformam-se em luz e a luz em trevas. A falta de parâmetros é uma das características deste fenômeno de massa.
Desta forma, o mal deixa de ser circunstancial e individual e torna-se um fenômeno sociológico. Todos passam a aceitá-lo, se não de forma explícita, de forma silenciosa e sem questionamentos.
Creio que a corrupção e a violência do Brasil tendem a caminhar nesta direção. Pregoeiros da justiça moral, gente que levanta a bandeira da conduta ética de repente é pega envolvida em escândalos nada triviais. O mal, banal, passa a ter raízes profundas. Aqueles que combatem posturas de políticos desonestos reproduzem o modelo, sendo agentes passivos ou ativos na primeira oportunidade que tiverem de ganhos ilícitos.
O oportunismo político tem cada vez mais aceitação resignada da população, não só pelo político corrompido, mas pelo empresário, corruptor e pelo funcionário coadjuvante, que admitem as regras do jogo do suborno como se elas fossem o único meio de sobrevivência. Facilmente nos deixamos corromper pelo oportunismo seduzidos pelo poder e pelo dinheiro. O mal se banaliza e se torna institucionalizado.
É bom lembrar, porém, que o mal banalizado enfraquece os valores morais de uma sociedade e relativiza a ética que constrói os pilares sociais. Apesar do mal ter se tornado tão comum, devemos nos lembrar que o mal continua sendo mal na sua essência, derivativo de lúcifer, e que na sua natureza conspira contra o bem e aquilo que é divino.

As características do Mal

Antes de estudarmos o mal e seus efeitos, precisamos reconhecer algumas de suas características:

A.    Mal, mais que um conceito, é uma realidade – A Bíblia não se refere ao mal abstratamente, mas como algo concreto, tangível, perceptível. Jesus, que também curou muitas pessoas lunáticas, exorcizou muitos "endemoninhados". Se Jesus não soubesse a diferença entre um possesso e uma pessoa que tem um problema mental, a Bíblia não diferenciaria entre um e outro. Em Mt 4.24, nos é dito: "trouxeram-lhe, então, todos os doentes, acometidos de várias enfermidades e tormentos: endemoninhados, lunáticos e paralíticos. E ele os curou". A referência a lunáticos é interessante, porque conquanto a Bíblia não tivesse como classificar as doenças mentais como hoje o fazemos, demonstra que Jesus sabia diferenciar entre uma pessoa doente da alma, do físico e aqueles que tinham problemas espirituais, ainda que a terminologia psiquiátrica daqueles dias não fosse tão rebuscada quanto a do século XXI. Ela usa o termo lunático, para referir-se a pessoas que tinham problemas de esquizofrenia, psicoses, transtornos bipolares, etc, porque esta era a forma de se classificar a doença mental naqueles dias.

B.     Mal, mais que uma idéia é uma pessoa, e como tal possui identidade, personalidade, vontade e projetos. Não é algo vago. O mal é descrito como um ser pessoal chamado de diabo, satanás, lúcifer, e possui toda uma nomenclatura que revela quem ele é. Por exemplo: a tradução da palavra satanás, literalmente é adversário. A palavra diabo (grego diabolos), literalmente significa “aquele que divide. Lúcifer, etmologicamente é “anjo de luz”, pela sua enorme habilidade de camuflar, de nos fazer pensar que o mal é bem, e o bem, mal; que as sombras são luz, e a luz, sombras, que a verdade é mentira e a mentira pode se transformar em verdade, de tornar o que é errado certo e questionando o certo, dar-lhe uma idéia de que é errado.

A natureza do Mal

O mal é descrito como "espírito imundo" (Mc 5.2). Isto define o caráter do mal e mostra o que ele faz ao dominar e controlar os seres humanos ou uma situação histórica. Ele deforma o caráter da pessoa, torna suas atitudes morais em atitudes imundas. Uma pessoa possessa por uma entidade espiritual se animaliza e começa a reproduzir suas atitudes grotescas, por mais sofisticada que seja, passando a se chafurdar na imundície moral. Satanás é um ser de penumbras e sombras e as pessoas que vivem debaixo de sua influência tornam-se malignas nas suas atitudes.
Átila Brandão, hoje um pregador do Evangelho, ex-assessor de Antonio Carlos Magalhães na Bahia, conta que no processo para se tornar pai de santo, é necessário que a pessoa passe por vários rituais como beber sangue de animais sacrificados, manter relações homossexuais e comer carne de cadáveres em rituais de magia negra. Tudo isto demonstra o nível de degradação moral e espiritual que satanás gera em seus seguidores: Ele é imundo, e torna eticamente imundo aqueles que o seguem, assim como Deus é santo, e todos aqueles que se deixam dominar pelo Espírito Santo, começam a reproduzir esta Santidade que nos é comunicada pelo Espírito, já que santificação é também uma obra do Espírito de Deus em nós. Em Mc 5.3 vemos que a degradação moral havia atingido profundamente a vida daquele homem, que "vivia nos sepulcros, e nem mesmo com cadeias alguém podia prendê-lo" (vs.3) e mais adiante: "Andava sempre, de noite e de dia, clamando por entre os sepulcros e pelos montes, ferindo-se com pedras" (vs 5). O espírito imundo torna imundo caráter daqueles que por ele são dominados, seja no campo das idéias, seja no domínio corporal.

As formas de ação do mal

Satanás usa muitas estratégias para que nos aliemos a ele. Satanás está vivo e ativo no planeta terra, e ele deseja nos desviar do caminho de Deus. Suas estratégias são variadas e complexas, mas não ignoramos os seus desígnios (2 Co 2.11), porque a Palavra de Deus nos fala de sua forma de ação. Vejamos algumas delas:

A.    Satanás age por sugestão - Ele tenta nos convencer de que o que ele diz faz sentido. Ele atrai com propostas interessantes, atraentes, a isto chamamos de tentação. Tome, por exemplo, o episódio de Adão e Eva no Éden. Satanás sugere que Deus não estava bem intencionado com eles, questiona o conteúdo e a validade da mensagem que Deus dera a Eva, a faz pensar que no universo não há juízo moral, que eles poderiam pecar e isto não traria nenhuma conseqüência. Desta forma consegue levar Adão e Eva a romper com Deus. Neste caso, a estratégia foi a persuasão, a sugestão. Muitas vezes também pensamos que os princípios de Deus não valem a pena, que o bem nem sempre vence, que se continuarmos sendo justos seremos massacrados pelo mal, que em determinadas situações precisamos usar as armas do mal para derrotar o mal. Aqui, satanás age usando os meios filosóficos, sistemas epistemológicas para ironizar os absolutos de Deus.

B.     Opressão Trata-se de uma ação psicológica. O diabo faz acusações, gera culpa, angústia, medos, ansiedades e ameaças nos nossos corações, inclusive de pessoas cristãs. Parece que foi isto que aconteceu com Paulo quando estavam fazendo missões na Ásia, já que satanás havia gerado uma circunstância tão aflitiva para aqueles obreiros, acima das suas próprias forcas, que eles chegaram a se desesperar da própria vida (2 Co 1.9). 

Muitos cristãos já passaram por muitas situações de opressão, tribulação, mentiras, injustas acusações por governos dominados por forças demoníacas. Em nossos dias, assim como nos tempos apostólicos, somos assolados pelas dúvidas teológicas (como no caso de João Batista em Mt 11), pensamentos estranhos e doloridos tomam conta de nosso coração, e muitas vezes sabemos que é o diabo querendo roubar nossa paz, outras vezes não conseguimos identificar a obra maligna, e tratamos como crise existencial, psicológica ou mental. Seja numa situação ou noutra, somos oprimidos, atribulados e abatidos (2 Co 4.7-10).

C.     Outra forma menos discutida é demonização que tem a ver com a cultura específica de um povo. Por exemplo: os alemães, desde o massacre ocorrido na Segunda Guerra Mundial, tem sido considerado o povo mais triste do Planeta. Outro exemplo clássico no Brasil é a massificação da corrupção: Corrupção é um vírus demoníaco que penetrou nossa cultura e isto tem gerado prejuízos imensos para a vida das pessoas, para o Reino de Deus, porque desvios financeiros afetam a vida de pessoas pobres pois esse dinheiro poderia ser usado para a promoção do bem estar social. O diabo tem roubado a dignidade de milhões de pessoas neste país, por causa da “cafajestice” de políticos inescrupulosos que já tem se tornado endêmica, sistêmica e pandêmica em todos os escalões. Isto é um processo de demonização de uma cultura.
Linthicum afirma: “O protestantismo evangélico tende a centrar sua teologia na obra de Deus para salvação do ser humano. Particularmente em suas formas populares, menos refletidas, o evangelho é historicamente proclamado em termos de salvação individual, o chamamento do pecador a Cristo. Por causa desta ênfase na salvação individual, os evangélicos tendem a abordar o mal como individual (...) O perigo de tal abordagem é que aqueles que acentuam exclusivamente as dimensões individuais da salvação não podem entender a abrangência total do mal e nem apreciar o trabalho total da salvação em Cristo”.[8]
Mais adiante Linthicum afirma: “Os sistemas mais importantes de uma cidade são as instituições econômica, política e religiosa. Estes sistemas interagem e cooperam nos com os outros constantemente, resultando daí em alianças numa trindade perversa (...) Os sistemas podem ser igualmente demoníacos, apoiando o privilégio econômico de poucos enquanto exploram os pobres e oprimidos, usando a ordem política para legitimar tal exploração (...) Há, entretanto, uma força muito mais poderosa, que pressiona os sistemas econômicos, político e religioso em busca de seu próprio interesse e do mal. Este é o poder penetrante e escravizador ao qual a Bíblia chama de “principados e potestades”.[9]
A cultura, neste caso, torna-se identificada com processos malignos. Existe muita coisa estranha em nosso país e em outros países que, infelizmente não conseguimos diagnosticar corretamente, mas que são resultado de uma dominação quase que absoluta das trevas e só poderão ser vencidos com a presença da igreja de Cristo e pela iluminação das mentes pelo Espírito Santo.

D.    Por último, age também por possessão. Em Mc 5, texto que lemos em parte, nos é descrito que "veio dos sepulcros, ao seu encontro, um homem possesso" (vs.2). Neste caso, a personalidade de uma pessoa é con-fundida (este hífen é intencional) com a de um espírito maligno, e ela é totalmente dominada. Por isto se diz nos terreiros de umbanda e candomblé que a pessoa é mula de um demônio. A pessoa fica dominada por uma força maior do que ela e não consegue reagir, apenas o poder de Deus pode trazer libertação à sua alma. O texto ainda afirma: "tendo sido muitas vezes preso com grilhões e cadeias, as cadeias foram quebradas por ele, e os grilhões, despedaçados. E ninguém podia subjugá-lo" (vs.4). Já que estava subjugado por outra força, a do espírito maligno. Existem muitas pessoas presas pelo diabo, sem esperança, pensando que deverão ficar presas pelo resto de suas vidas em processos de sofrimento, mas a Bíblia afirma "Para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obras do diabo" (1 Jo 3.8).

O Mal gera profunda angústia para a psiquê humana. Dê uma lida mais detalhada em Marcos 5 para perceber o quadro angustiante da personalidade destrutiva daquela pessoa: "Andava sempre, de noite e de dia, clamando por entre os sepulcros e pelos montes, ferindo-se com pedras" (vs 5). Este homem vivia num inferno interior. Angustiado, acuado e amedrontado. Existe uma força que o destrói e ele não tem condições de reagir.
Possessão descreve bem o fato de que satanás age por usurpação (Cl 1.13), neste caso, o mal tira o homem do seu propósito original que era glorificar a Deus e gozá-lo para sempre, e o faz viver aquém daquilo que Deus planejou para sua vida. Tornando-se pobre, infeliz e impotente diante da oposição que o diabo lhe faz.

O Poder do Mal

Para tentar compreender melhor este assunto, estaremos analisando o texto de Mc 5.1-20, que nos fala da libertação do endeminhado geraseno (ou gadareno).
Aqui observamos que as pessoas tentaram dominar o mal acorrentando o possesso. O texto nos afirma que tudo isto era inútil, porque não se vence o mal criando barreiras, cadeias e correntes humanas. A forma de batalha para se combater o diabo é espiritual. Por isto Jesus certa vez afirmou que certas castas não são vencidas senão pela oração e Jejum (Mc 9.8). O mal não é subjugado por sistemas. As pessoas daquela região tentaram controlar e dominar o mal, mas o texto afirma "E ninguém podia subjugá-lo" (Mc 5.4). O diabo é contundente, um ser sem misericórdia, acusador, e espiritualmente o forte. Ninguém deve tentar vencer o mal por forças humanas, ou por força de vontade, ou por controle da mente, mas o mal é vencido pelo sangue de Cristo, pelo poder do Espírito, pela oração. Por isto, a pessoa mais simples da igreja, com a oração mais débil, mas de joelho contrito e quebrantado tem o poder de exorcizar o mal e trazer a presença de Cristo para o seu lar, para sua vida, para um determinado ambiente de trabalho, porque "maior é aquele que está em vós, do que aquele que está no mundo" (1 Jo 4.4).

Três opções
Johnson[10] afirma que podemos ter três opções diante da idéia do mal:
A primeira é afirmar que tais eventos na verdade não ocorrem. Podemos interpretar os eventos relacionamentos ao mal no Novo Testamento em termos de como as pessoas daqueles dias viam a ação maligna, e desde que Jesus veio livrar as pessoas do medo, os escritores cristãos relataram tais estórias esperando trazer algum tipo de conforto às almas atribuladas.
A segunda opção é afirmar que tais histórias de atividades demoníacas são uma forma de descrever nosso mundo quebrado. Os fenômenos atribuídos aos demônios no primeiro século poderiam ser explicados por causas naturais, estudando os fatores químicos, neurológicos e psicológicos a eles relacionados. Jesus, tentando se relacionar com as pessoas nas condições e culturas em que viviam, a si mesmo se acomodou nesta leitura da realidade. Se as pessoas acreditavam que seus traumas e desordens eram causados por espíritos demoníacos, então Jesus decidiu trabalhar neste nível de crença, ao invés de tentar modificar a sua forma de pensar e sua cosmovisão. Jesus simplesmente entrou nesta visão de mundo.
A terceira opção é assumir que os relatos do Novo Testamento de fato aconteceram. Esta visão afirma que apesar de não podermos descrever com precisão cientifica os fatos acontecidos, realmente estes espíritos imundos e entidades existem. Assim como Deus faz sua obra por meio de seus enviados, que são os anjos; Satanás se utiliza de seres espirituais malignos para realizar sua obra. Neste caso, os espíritos malignos realmente existem e podem de certa forma controlar pessoas e sistemas do mundo, causando desordem e destruição, assim como afirma João: “para isto se manifestou o Filho do Homem, para destruir as obras do diabo” (1 Jo 3.8).
Se a terceira opção é a correta, e é exatamente nisto que cremos, surgem novas indagações:
                “Os demônios ainda operam na era atual possuindo o corpo de pessoas?”
                “Como discernir manifestações de histeria, psicoses e esquizofrenia de atuações malignas?”
                “Como se dá este processo de demonização? Que vínculos comprometem a realidade destas pessoas a tal ponto?”
C. S. Lewis afirma que o diabo sempre envia erros ao mundo em pares – pares de opostos. E sempre nos encoraja a gastar um bom tempo pensando em qual é o pior. Acerca dos demônios, os opostos são: de um lado nos tornarmos tão obcecados pelo diabo que passamos a enxergá-lo em cada arbusto, ou nas coisas mais comezinhas da vida. Já vi pessoas expulsando o demônio de seu carro, porque o motor havia fundido; de outro lado, ignorar sua presença e acreditar que o mal é apenas uma projeção psicológica.
Johnson ainda afirma que o cristianismo enxerga o mundo em quatro dimensões: “Quando tentamos entender o que está acontecendo em nossas vidas, em nossas cidades ou no mundo, temos que levar em conta a natureza humana, o universo físico, o Deus vivo, e as coisas não vistas, criadas, “seres espirituais” e poderes – tudo em quatro dimensões”[11].

As Estratégias do Mal

O leque de atuação do diabo é bem amplo. Ele usa estratégias diferentes para distintas situações. Por isto é que a Palavra de Deus se refere ao “príncipe do reino da Pérsia”(Dn 10.13) e “O Príncipe da Grécia” (Dn 10.20), mencionando formas diferentes da atuação de entidades malignas para determinadas condições políticas, culturais e históricas. Na forma popular de um amigo meu de dizer quando morávamos no Rio de Janeiro: “O demônio da Zona Sul não é o mesmo da Zona Norte”.

1.       Quanto ao possesso – Em Mc 5, Satanás tem uma estratégia em relação a personalidade deste homem. Seu alvo era enlouquecê-lo, desequilibrar suas emoções e o seu corpo, impedir que ele pudesse viver de forma plena e abençoada. Seu corpo sofre ações violentas do mal. Dentro dele não existe uma personalidade integrada, mas fragmentada, não existe um indivíduo, uma unicidade na sua alma, mas uma legião. Demônios disputavam o espaço de sua consciência com acusações, culpas, angústia e peso.

2.       Quanto à cultura – Existe aqui outro processo que precisa ser considerado: Satanás se identificou e se amalgamou com tal cultura, fazia parte de seu ambiente. As pessoas já não mais se chocavam com aquele quadro, acostumaram-se a ele. Assim como as pessoas de Nínive, jovens e velhos (Gn 19.4), acostumaram-se com abusos sexuais; assim como o Brasil se acostumou com a corrupção e não mais se assusta com ela. Assim como determinadas cidades vivem debaixo do mal e aprendem a se relacionar com ele, como no caso de Éfeso, que tinha uma profetisa endemoniada que dava lucros aos seus senhores, uma cidade cujo povo praticava prostituição religiosa com as sacerdotisas em verdadeiras orgias dentro do templo e achavam isto normal. A cultura de Gadara já incorporara, no seu inconsciente coletivo, a relação patológica com aquela pessoa destrutiva e imunda e aquilo não mais os incomodava. Acostumara-se com o mal. Um dos alvos estratégicos de satanás é enfraquecer valores, arrebentar com uma cultura local com ensinos de demônios e torná-los aceitáveis.

O que é ainda mais enfático e assustador neste texto, é que por causa da convivência com o mal, aquele povo prefere o diabo com eles que a presença de Jesus. Porque a presença de Jesus desestabiliza o status quo, altera o modus vivendi da comunidade. Por isto, eles resolvem pedir a Jesus que "se retirasse da terra deles" (Mc 5.17). Existem pessoas que não querem se livrar do diabo, por causa das perdas que terão, inclusive financeira, social, status,etc. Sabem que, se continuarem debaixo do domínio do diabo serão destruídos, mas não conseguem dar um salto de fé e rejeitar o mal com suas implicações, por causa do preço que têm a pagar. Os moradores daquele lugar rejeitam a Cristo e ficam com o demônio, porque Jesus mexe nos chiqueiro deles. Existem muitos que não querem que Deus mexa no chiqueiro de suas vidas, desestabilize a podridão com a qual estão habituados a viver e caminham para a morte por não romper com este estado de coisa.

3.       Quanto a Deus – Satanás também precisa usar de determinada estratégia quanto a Deus. E o que ele faz aqui neste texto? Como ele se aproxima de Jesus, o Filho do Deus vivo? "Quando, de longe, viu Jesus, correu e o adorou" (Mc 5.6). Não é impressionante que satanás corra para "adorar" a Jesus? Na verdade o texto afirma que isto se deu por causa da confrontação que Jesus faz a este ato maligno: "Espírito imundo, sai desse homem!" (Mc 5.8). Satanás não tem outra opção senão se curvar diante de Deus porque seres espirituais se percebem. Neste nosso mundo as realidades espirituais são intercomunicáveis, elas se revelam de forma direta. Em At 19, o espírito maligno afirma diante de alguns judeus exorcitas: "Conheço a Jesus e sei quem é Paulo; mas vós, quem sois?" (At 19.15). Quando o diabo afirma conheço a Jesus, ele usa o termo ginosko, conheço por interação, porque nas realidades espirituais nossas historias se cruzam. Mas quando fala sei quem é Paulo, ele afirma que tem conhecimento do procedimento, atos e comportamentos de Paulo.

Certa feita lidava com uma pessoa possessa, e no meio do trabalho de exorcismo o demônio diz: "Rev Samuel, eu te conheço". Confesso que me assustei um pouco com aquela afirmação, mas depois afirmei: É óbvio que ele me conhece... sabe das minhas tentações e fraquezas, meus limites e minha família. Se tivermos medo disto não vamos conseguir viver...
O texto nos afirma que Satanás se curva diante de Deus. Porque é assim que deve ser. O diabo nunca poderá ter outra atitude diante da autoridade do Pai. Não existe maniqueísmo na Bíblia: duas forças iguais com igual poder se digladiando. Satanás é sujeito ao Pai, e Deus deu também poder e autoridade a nós seus filhos para confrontarmos as obras das trevas: "Eis aí vos dei autoridade para pisardes serpentes e escorpiões, e sobre todo o poder do inimigo, e nada, absolutamente, vos causará dano" (Lc 10.19). Gosto deste texto, especialmente da afirmação absolutamente.

Os temores do Mal

O que ameaça o diabo? O que ele teme? Mais uma vez usaremos o texto de Marcos 5, que nos  ensina algumas preciosas lições sobre este assunto:

1.       O diabo treme diante da presença de Deus – Em Tiago 2.19 lemos: "crês tu que Deus é um só? Fazes bem. Até o diabo crê e estremece". A glória de Deus é repulsiva ao diabo, por isto é que a adoração, feita de coração, invocação e qualquer culto a Deus quando oferecido de coração, é uma ameaça ao reino das trevas. Deus é luz, e a luz lança fora as trevas, se opõe às trevas. Satanás abomina a luz. Neste texto, satanás grita em alta voz: "que tenho eu contigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Conjuro-te por Deus que não me atormentes!" (Mc 5.7).

2.       O diabo treme quando é desestabilizado – "E rogou-lhe encarecidamente que os não mandasse para fora do país" (Mc 5.10). Ele se sente ameaçado quando as suas estruturas são tocadas. Muitas vezes o diabo está aninhado, domesticado, e o Evangelho chega para destruir suas obras . Satanás é bicho manso, renhido, tinhoso, que se agrada de continuar na penumbra, incomodando sem ser incomodado. Agindo sem ser desmascarado. Nada pode ser mais ameaçador para satanás que o lançar luz nas suas artimanhas e descobrir seus métodos, porque isto desestabiliza sua forma de ser e agir. Confronta seus planos.

3.       O diabo treme quando o povo de Deus ora – Nós pouco entendemos do poder da oração. Apesar de ouvirmos tantas coisas sendo ditas a este respeito, ainda ignoramos a eficácia da oração e somos ingênuos quanto a este assunto. Por isto não oramos, não aprendemos o poder que é liberado para o povo de Deus quando este ora. Nossas reuniões de oração estão entregue a míngua, a liderança não tem o hábito de orar. Deixamos nossas vidas desprotegidas, a igreja fica descoberta espiritualmente. Oração traz santificação espiritual, agita os céus e faz estremecer o inferno.

4.       O diabo se apavora quando pessoas se convertem – Satanás treme também quando vidas começam a ser trazidas do império das trevas para o reino do filho do Seu amor. Quando pessoas que estavam sendo guiadas pelo príncipe da potestade do ar, se entregam a Jesus, e saem do seu domínio. Muitas pessoas se tornam religiosas, mas isto não é o bastante, temos que nos converter. Entregar nossa vida de forma incondicional a Deus, nos rendermos a Jesus. A entrega de nossa vida a Deus pode se tornar uma grande luta espiritual, mas só existe uma forma de romper do domínio do diabo em nossas vidas. Uma entrega incondicional e plena a Cristo. Reconhecer nossos pecados, reconhecer nossa necessidade de Deus, entender o plano de Cristo naquela cruz e voltarmos para Deus. O diabo se sente ameaçado quando um pecador larga seus vícios, sua justiça própria e volta-se para Deus.

5.       Satanás enfraquece quando o Perdão é oferecido – Satanás é profundamente confrontado com perdão. Ele é aquele que divide. Então, a amargura, o ressentimento, o ódio, se tornam armas extremamente eficazes nas suas mãos. Com tais armas ele mantém muitas vidas cativas, sem liberdade interior. Perdão libera vida, traz reconciliação, restaura lares, unifica igrejas. O diabo perde seu domínio quando reina a paz e o perdão. Satanás se nutre da força que damos a ele, e perdoar é retirar sua força. "A quem perdoais alguma coisa, também eu perdôo (...) para que satanás não alcance vantagem sobre nós" (2 Co 2.10). Satanás obtém vitória sobre nossa vida quando não perdoamos.

6.       Satanás é desmascarado pela Confrontação – É o que vemos Jesus fazendo aqui. Ele confronta o mal, desmascara o mal, expõe sua estratégia trazendo-a a público. Por que o diabo habitava ali por tanto tempo? Porque ele não era percebido. Paulo afirmava que nós, como igreja e povo de Deus, "...não lhe ignoramos os desígnios" (2 Co 2.11). Às vezes questiono se esta tem sido a nossa experiência, de ter consciência de seus desígnios. Se não temos, precisamos pedir a Deus, nosso Pai, para que nos dê dons de discernimento, para aprender a discernir de forma madura, a estratégia do diabo contra nossas vidas, nossos lares, nossa igreja e nossa sociedade. Não podemos ter convivência pacifica com o diabo, mas precisamos aprender a confrontar ousadamente as forças espirituais das trevas que conspiram contra nossa santidade e contra o reino de Deus.

Como Jesus lida com o Mal

 – Este texto nos ensina como Jesus lidava com o inimigo.

1.      A primeira ação de Jesus é de amor para com aquele homem violentado e dominado pelo diabo. Jesus tem compaixão dele. Isto é evidenciado por dois fatos aqui relatados. O primeiro deles é que Jesus vai se encontrar com este homem. Aproxima-se de sua história de dor e angústia, de aprisionamento e sofrimento. Segundo, porque nada que Jesus faz é desproposital. Em Gadara, que ficava do outro lado do Mar da Galiléia, o único ato público foi libertar esta vida, já que todos os moradores pediram para que Jesus saísse de lá após terem prejuízos em seus negócios. Jesus faz toda esta viagem, só para libertar uma vida. Jesus amou aquele homem, e veio para trazer libertação ao seu coração. Temos que aprender a lidar com compaixão e sensibilidade para com aqueles que são vitimados pelo diabo, e já não conseguem mais superar o domínio acachapante que ele tem exercido sobre suas vidas.

2.      Jesus confronta o mal – ele desmascara o diabo, mostra quem está por detrás daquele quadro caótico, desta alma em sofrimento. Este mesmo poder Jesus ofereceu e tem dado a sua igreja: "Eis ai vos dei autoridade para pisardes serpentes e escorpiões e sobre todo o poder do inimigo, e nada, absolutamente, vos causará dano" (Lc 10.19). Jesus é o “homem mais valente” da parábola que ele mesmo contou em Mc 3.20-30. Ele acorrentou o homem valente na cruz. Ele fez isto da forma mais estranha: morrendo na cruz. “também ele, igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo, e livrasse todos que, pelo pavor da morte, estavam sujeitos à escravidão por toda a vida” (Hb 2.14-15). Através de sua morte, ele venceu o mal. O Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, torna-se o leão da tribo de Davi que tem as chaves da morte e do inferno.

3.      Jesus restaura o equilíbrio para o homem – Traz graça ao seu coração, o faz novo, equilibra suas emoções. "Indo ter com Jesus, viram o endemoninhado, o que tivera a legião, assentado, vestido, em perfeito juízo" (Mc 5.15). Aquele homem desassossegado encontra tranqüilidade, aflito encontra paz, ferido encontra cura, desnorteado encontra direção, com vínculos quebrados encontra relação. Jesus  ordena que volte para sua casa, por que talvez outras pessoas da sua família estivessem precisando da mesma graça e do mesmo poder que ele agora experimentava em sua vida. "Vai para tua casa, para os teus, anuncia-lhes tudo o que o Senhor te fez e como teve compaixão de ti" (Mc 5.19).

4.      Jesus valoriza mais a vida que os bens – O texto nos revela o enorme contraste entre o capitalismo desumano daqueles homens e a sensibilidade espiritual de Jesus. Quando tiveram prejuízo não quiseram Jesus. A lição é a seguinte: Se for necessário passar por prejuízo para que a vida floresça em você, não se assuste, Deus pode fazer isto e fará. Mas o mais importante é perceber onde os valores do reino estão colocados. Jesus dá valor ao ser humano, porque "O Filho do homem veio buscar e salvar o perdido" (Lc 19.10).


Fuja de toda forma do mal

O mal veste muitas faces e se apresenta de formas variadas, por isto o apostolo Paulo nos exorta a fugir de toda aparência do mal (1 Ts 5.22). Uma de suas formas mais sutis é o diabo travestido de bondade (2 Co 11.13-15) ou espiritualidade para acobertar o coração maligno (1 Tm 6.3-6). O mal pode ter aparência de bem, com carinhas simpáticas para levar homens ao inferno. Como cristãos devemos estar alertas e fugir de “toda forma do mal”. Nem tudo que é mal tem forma de mal, nem tudo que é bom, “parece” ser bom. Por isto, o cristão deve fugir de tudo aquilo que conspira contra o reino de Deus, ainda que venha de forma dissimulada. O mal tem muitas formas, não se identifique com nenhuma de suas caricaturas. “Fugi da aparência do mal” (5.22). Mas, acima de tudo, devemos ter cuidado com o mal travestido de bondade, pois quanto mais sutil, mais diabólico (5.2). É como espinho de peixe, quanto menor, mais perigoso. Afinal, o diabo veste Prada.

Quais são as formas do mal?

1.       O Mal, em todas as suas formas, primitiva ou sofisticada, sempre traz prejuízo físico e moral aos outros – Mal em inglês é evil, que de trás para frente é live que significa viver. Scott Peck afirma que o mal é anti-vida, é o oposto da vida. Onde ele se revelar a vida perde sua intensidade e valor. Paulo afirma: “não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem”. Quando tentamos vencer o mal com mal, entramos na esfera do diabo, e as conseqüências podem ser muito graves. Ao usar os princípios do mal, saímos da esfera do sobrenatural e nos tornamos abertos ao demônio. Por isto a bíblia diz, por exemplo, que “a ira do homem não produz a justiça divina”. Isto tem a ver com a vingança, quando queremos retribuir alguém mal por mal. A ausência de perdão faz com que recusemos agir de forma bondosa para ferir quem nos feriu, e nós sabemos muito bem os efeitos da ira, ausência de perdão e vingança na vida dos seres humanos.

2.       O Mal, na sua forma mais perversa, torna Deus secundário ou descartável em nossa vida. Quando as bases de nossa ética não são mais os absolutos de Deus, ou quando operamos com base na nossa carnalidade e nos impulsos pessoais, estamos desprezando os conselhos de Deus e sua orientação. Os princípios de Deus, são para nortear nossa vida e nos orientar, seu propósito é nos dar vida. Muitas vezes desprezamos a orientação da Deus e fazemos as coisas à nossa maneira.
A Bíblia, porém, nos leva a pensar nos riscos de fazermos as coisas usando nossas próprias armas. O salmista afirma: “Ora, destruídos os fundamentos, que poderá fazer o justo?” (Sl 11.3). Quando retiramos de nossas vidas a orientação de Deus, o que passa a nortear nossa caminhada? A característica do mal é a substituição de Deus e a centralização do homem. O homem é egocêntrico e sofisticado na sua forma de malignidade, e quando faz da sua forma sempre perde a referência de Deus e sofre um processo de auto engano.

3.       A Palavra de Deus nos exorta a não apenas fugir do mal, mas nos adverte para fugirmos da aparência do mal – Existe muita coisa que não é má em si, mas aparenta ser mal. Alguns anos atrás um amigo me ensinou que “o cristão não pode ser apenas bom, ele tem que parecer bom”. Quando nos assentamos com lobos, aprendemos a uivar. Fuja do mal, mas fuja também de sua aparência. Associações e alianças comprometedoras que podem nos identificar com o mal são péssimas para o testemunho cristão.

O Futuro do Mal
Embora o mal seja real em nosso mundo, ele não ficará para sempre. Deus prometeu que haverá um novo mundo após a segunda vinda de Jesus. Será um mundo sem choro, dor e morte. Tudo será feito novo (Apocalipse 21:5). O paraíso que Adão e Eva perderam será recuperado. Enquanto isto não acontece, os cristãos têm que lutar contra o mal, a imoralidade e a corrupção. O cristão não se conforma com o mal e chama as coisas de certas quando são erradas. O cristão também aborrece e odeia o pecado.
Apesar de não entendermos a complexidade destes fatos, somos exortados a lutar contra toda forma de expressão, violência e anti-vida com a qual nos defrontamos. “Precisamos resgatar a capacidade de indignação e dor diante da miséria que assola a América Latina” (Oscar Bulhole). Devemos lutar contra toda expressão satânica ou humana do mal, da injustiça e da opressão, lembrando que “A religião pura e sem mácula para com nosso Deus e Pai é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo” (Tg 1.27).
O mal não pode ser explicado em todas as suas dimensões, mas isto não pode levar-nos a uma atitude cômoda em não combatê-lo com a prática do bem. O mal e a dor podem não ser teologicamente explicados, mas devem ser confrontados com o exercício do bem e da promoção do Reino de Deus. Quando somos a vítima do mal, somos também desafiados a enfrentá-lo com coragem, fé e esperança. “Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem” (Rm 12.31).

Como vencer o mal?

Muitas vezes o mal nos assola de forma impetuosa e dolorida. Somos vitimados sem termos qualquer possibilidade de reação. São famílias que perdem seus entes queridos porque uma pessoa irresponsável estava encharcada de álcool dirigindo um carro. Outros sofrem abusos morais, psicológicos e sociais, alguns são abusados sexualmente, infamados, injuriados. Todos os dias, muitos são os  impactados pelo mal em suas vidas. Como responder a ataques malignos. Como devemos agir?
Em Rm 12.9-21 vemos um belíssimo tratado de Paulo sobre a forma como devemos lidar com o mal. O texto inicia com a afirmação: “Detestai o mal, apegando-vos ao bem”(Rm 12.9), e termina afirmando: “Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem”( Rm 12.21). Inicia e termina com a idéia do mal. Isto demonstra que o mal encontra-se diante de nós, e que devemos saber como lidar com ele. Quando alguém me faz o mal, como devo reagir? Quais devem ser minhas reações às agressões sofridas? Que orientação posso encontrar na Palavra de Deus sobre este assunto?
Este texto nos exorta a “vencer o mal”. Por isto é importante analisar mais profundamente estas verdades. A vitória sobre o mal é uma possibilidade genuína (Rm 12.21). A batalha na vida cristã é uma oportunidade (e não apenas um desafio), para superarmos a obra do mal em nossas vidas.
Muitos ficam se lamentando diante do mal: As pessoas me fizeram isto, meu marido fez isto, meu amigo, meu chefe, meu companheiro de trabalho, me filho, as circunstâncias, etc. Nós não temos dúvida que pessoas fazem o mal contra nós, e de muitas formas. O mal está fortemente presente no nosso dia a dia. Mas o fato de terem feito o mal contra nós não é razão para nos sentirmos derrotados. Deus nos ordena vencer o mal com o bem. Ele nos responsabiliza em responder de forma positiva aos ataques recebidos e afirma que é possível vencer o mal.
Que tipo de inimigo é este? Como afirmamos no inicio, o mal na Bíblia não é algo genérico e abstrato, mas possui personalidade, é personificado, se opõe a Deus e é direcionado contra nós, por isso precisamos derrotá-lo. Ele quer atacar-nos, enfraquecer-nos e vencer-nos. Quando o mal consegue isso é mais que uma tragédia pessoal. O nome do Evangelho, da igreja e de Cristo é envergonhado. Precisamos vencer o mal por causa da glória de Deus e do Evangelho.
Jay Adams afirma: “A essência do mal, então, está, não no fato de que ele tem poder para lhe causar sofrimento (que é o seu efeito), nem no fato de que ele foi provocado (O que o torna hediondo), mas no fato de que ele é contra Deus... é mal contra um cristão porque ele é um cristão”. Este ataque envolve você e exige uma resposta cristã baseada em Deus. A luz sempre vence a treva. Trevas e sombras não podem superar a luz. Quando surge o sol a noite desaparece. Nós somos luz!
Temos vencido o mal em nossa vida ou temos uma vida de derrota? Nossa vida é uma batalha e o cristão é chamado para esta guerra. A cruz não foi uma atitude passiva de Cristo. Ele veio destruir as obras do diabo (Hb 2.14) e triunfou dos principados e potestades na cruz. Ele deu sua vida, ela não foi tomada. A cruz foi ativa. O cristão não é hinduísta (que prega a não violência), mas é o ser mais violento na face da terra. Ele recebeu ordens de Deus para lutar e derrotar o mal. É um exército do bem, mobilizado para vencer o mal.

Quais são nossas armas?

Paulo diz que elas não são carnais, mas poderosas em Deus (2 Co 10.4). Este exército deve usar armas apropriadas para vencer o mal. Os métodos e as armas do mundo não trarão vitória. Quando eles fazem o mal, nós fazemos o bem. Esta é a ordem do Senhor da batalha. Não existe outra opção, devemos seguir sua orientação.
O método de Deus é importante. O único jeito de vencer o mal é com o bem. Você não vai conseguir vencer o mal usando as armas do mal.
O que normalmente fazemos quando sofremos ofensas?
·         Veja o que ele fez comigo...
·         Estou fazendo apenas o que eles me fizeram...
São sentimentos que em geral expressam nossa frustração. Não é de se admirar porque há tanta falta de poder hoje na igreja, você não pode vencer o mal agindo com maldade.
A estratégia divina pressupõe que o mal não tem o poder que o bem possui. Quando o cristão se encontra na batalha ele deve usar as armas de Deus. Os métodos de Deus. Quando desobedecemos as ordens de nosso general, o exército de Deus se enfraquece grandemente.
O mal é uma força formidável. Um exército bem armado. Às vezes achamos que é impossível vencê-lo. Jesus nos treina para usar determinadas armas, quando usamos as armas do mal somos derrotados. O mal é poderoso, mas o bem ainda é maior. Só o bem poderá derrotar o mal. Trevas só podem ser vencidas com a luz. É uma lástima quando homens de Deus resolvem usar armas do diabo, porque acham que só as armas do diabo funcionam.
Quando o bem é usado de forma consistente, fiel e vigorosa, o inimigo é derrotado. Você foi chamado para ser vitorioso. Não lhe parece muito fácil, simplista e irrealista a proposta da Palavra de Deus?
Como você tem lutado contra o mal? Você tem usado as armas de Deus? Então esqueça seus medos e dúvidas. Use as armas corretas e confie nas ordens de seu general. Pare de tentar lutar usando seus métodos e sua estratégia, pare de tentar fazer por você mesmo. Você é um soldado, obedece ordens, não um comandante, responsável por dar as armar e as estratégias. Então, pare de ser insubmisso ao seu chefe, que é Jesus!


Conclusão:

Praset é uma frágil Thailandesa, com quem minha esposa, Sara Maria, teve o privilégio de conviver durante os dias de treinamento para Liderança cristã ministrado pelo Instituto Haggai em 2007. Ela fazia parte da única família cristã da região onde morava. Certa noite, enquanto oravam um grupo de pessoas resolveu invadir a sua casa arrombando as portas e janelas e começaram a jogar todas as suas coisas na rua: móveis, panelas, utensílios domésticos e roupas. Enquanto eles, de forma aparentemente impassível, continuavam a orar e a chorar diante de Deus, ainda que temendo por suas vidas.
Quando as pessoas foram embora, eles começaram a recolher os cacos de suas coisas, sem dizer uma palavra. Dias depois, aquelas pessoas começaram a se aproximar da família, tentando pedir desculpas e entender a atitude deles. Aos poucos, o testemunho do Evangelho começou a penetrar nos seus corações, e cerca de 100 pessoas vieram a aceitar Jesus como seu salvador pessoal. Esta é uma história que ilustra bem como o bem tem vencido o mal.
A cruz é o supremo exemplo de como usar o bem para derrotar o mal. Todos os poderes do inferno lutavam contra Deus. Como Jesus superou?
Transformou a vergonha da cruz (maldito), em um lugar de glória e salvação. Deus gloriosamente triunfou sobre a cruz. A morte parecia seu destino final, mas transformou-se no evento glorioso da ressurreição, e fomos beneficiados com a vitória do bem sobre o mal, que se deu na cruz.
Cristãos derrotam o mal, fazendo o bem. Esta é a grande estratégia de Jesus!


Samuel Vieira
Anápolis, 20 de Julho 2008


Bibliografia:

Adams, Jay - How to overcome evil. Phillisburg, New Jersey, Presbyterian and reformed Publishing, Co 1977, pg 11

Anderson, Neil T - The bondage breaker, Eugene, Oregon, Harvest House Publishers, 1990.

Buber, Martin – Good and evil. New York, Charles Scribner´s son, 1953

Fitch, williamDeus e o mal, São Paulo, Ed. PES, 1984

Johnson, Darrel WWho is Jesus? Vancouver, Canadá – Regente College Publishing, 2011, pg. 83

Lewis, C. S - The screwtape letters, New York, New American Library, 1988, pg xix.

Linthicum, RobertCidade de Deus, Cidade de Satanás, Belo Horizonte, Missão Editora, 1995

Peck, M. Scott - People of the Lie, New York, Simon and Schuster, 1983

Hammond, Frank e Ida MaePorcos na Sala, São Paulo, Editorial Unilit, 1973

Sanford John, AMAL: O lado sombrio da realidade, São Paulo, Ed. Paulinas, 1981

Zimbardo, Philip – “O Efeito Lúcifer” São Paulo, Ed. Record, 2013





[1] Peck, M. Scott - People of the Lie, New York, Simon and Schuster, pg 182.
[2] Peck, op. Citado, Pg. 183.
[3] Buber, Martin – Good and Evil. New York, The Scribner Library, 1953, pg 139
[4] Zimbardo, Philip – “O Efeito Lúcifer” São Paulo, Ed. Record, 2013
[5] Entrevista na REvista Veja, ed. 2335, ano 46 – n. 34, de 21 de agosto de 2013.
[6] Harnack, Adolf Von – citado por Robert H. Stein, in  Mark, Baker exegetical commentary on the New Testament. Michigan, Grand Rapids, Baker Academic, 2008, pg 33.
[7] Lewis, C. S. – The screwtape letters, New York, New American Library, 1988, pg xix.
[8] Linthicum, Robert – Cidade de Deus, Cidade de Satanás, Belo Horizonte, Missão Editora, 1995, pg 51
[9] . idem, op. cit. pg 72
[10] Johnson, Darrel W – Who is Jesus? Vaoncouver, Canadá – Regente College Publishing, 2011, pg. 83
[11] . Johnson, op cit. 2011, pg 85