A reclamação comum que encontramos da parte dos pastores é que mudanças não acontecem porque a liderança é obtusa, fechada e conservadora. Por mais que as transformações pareçam ser oportunas e necessárias, o medo do novo, a dificuldade com processos, eventualmente dificultam movimentos que poderiam trazer efeitos benéficos e duradouros.
A Bíblia mostra como mudanças de paradigmas podem ser difíceis.
A ordem clara de Jesus foi dada aos discípulos: “Mas recebereis poder ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém, como na Judeia, Samaria e até os confins da terra” (At 1.8). Eles deveriam sair de Jerusalém, ir ao encontro dos gentios, mas isto era tão revolucionário para a mentalidade judaica, que os discípulos se negaram a cumpri-la. Foi aí que Pedro recebeu a visão dos lençóis em Atos 10. Apesar da ordem clara, mesmo numa visão direta de Deus, Pedro se recusa a obedecê-la. Na verdade Pedro teve a visão não porque fosse um homem obediente, mas por causa de sua teimosia e dureza.
Pedro estava sendo confrontado com as mudanças que o próprio Espirito de Deus estava gerando, mas resistiu fortemente às mudanças, de forma confrontadora contra o próprio Deus. Finalmente ele aquiesceu. Mesmo assim muitas coisas precisaram ainda ser esclarecidas, e o capitulo 11 nos mostra porque Pedro estava tão hesitante. Ele teria que se explicar com a liderança de Jerusalém. Os apóstolos se reúnem querendo saber como ele se atreveu a entrar na casa de um gentio, comer com ele e lhe pregar o Evangelho.
Viram como as mudanças de paradigmas não são nada fáceis, mesmo quando a ordem de Deus é direta?
Isto acontece porque o novo, em teologia, é quase sempre negação do velho. Então, quando um fato novo surge, mesmo se tratando apenas de estratégias, formas e métodos, pode parecer herético. É fácil confundir acidente com essência, histórico com revelado e temporal com o eterno. Por esta razão, muitas igrejas continuam com o mesmo cardápio, a mesma abordagem, a mesma liturgia, para um povo vivendo num contexto diferente.
O Hino da Mocidade Presbiteriana do Brasil, composto por Moacir Bastos, diz o seguinte: “Somos jovens num mundo velho, a pregar novos ideais; do mesmo evangelho que pregaram nossos pais”. Muitas vezes, porém, tenho a impressão de que as pessoas gostariam de cantar: “Somos velhos num mundo novo, pregando ideais antigos”. A verdade é que muitas pessoas não querem, não sabem, ou não podem mudar. Este processo pode ser dolorido e angustiante, chegando mesmo a parecer uma traição à denominação ou aos antigos pressupostos pré estabelecidos. Em discussões como esta já ouvi pessoas resistentes a mudança alegarem que “se mudarmos as formas, mudaremos o conteúdo”. Elas realmente creem nisto! Não é sem razão que a possibilidade de mudança traga dor e tanta resistência.
Se o cenário é de um pensamento petrificado, como então, podemos esperar mudanças significativas?
Alguns mais impacientes respondem imediatamente e com acidez: “orem para que Deus promova estes irmãos!” Bem, muitas vezes, as mudanças acontecem desta forma mesmo. Seria espiritualmente correto afirmar que é necessário que uma liderança engessada seja promovida para a glória, a fim de que novos ares comecem a soprar? Por que esperar tanto tempo? Não seria possível tomar atitudes sensatas que ajudariam neste processo necessário de mudança?
Alguns princípios, para ajudar processos de mudança, se aplicados, podem se tornar valiosas ferramentas:
Primeiro, as pessoas precisam confiar no líder. Muitas pessoas que resistem, o fazem, porque ao levar em conta a história já viram tantas mudanças catastróficas, e hesitam em transformações. Isto as assusta! O problema é que, muitos pastores, ao serem designados para igrejas locais por seus presbitérios, equivocadamente pensam que são líderes daquela comunidade, quando na verdade, os líderes já estão lá antes de sua chegada. Alguns destes líderes já viram muitos outros pastores chegando e saindo, e alguns deles não eram muito confiáveis, eventualmente eram afoitos e inconsequentes, e saiam deixando a igreja desestruturada, e em muitos casos falidas espiritual e financeiramente.
Pesquisas apontam que um pastor normalmente leva sete anos para ser reconhecido como líder de uma igreja local. Podemos, então, concluir, que liderança se constrói e se conquista, não se impõe. Mudanças paulatinas para comunidades desconfiadas podem, aos poucos, demonstrar que o novo pastor deve ser seguido na sua liderança. Igrejas que passam por boas e positivas transformações o fazem porque se sentem seguras com a nova direção e rumo que precisa ser dado.
Segundo, a comunidade precisa ser inspirada para as mudanças. Ela precisa entender que tais mudanças serão de fato positivas. Se a comunidade é mais conservadora, a leitura imediata é que “as coisas estão boas do jeito que estão”, então, para que mudar. Alguns chegam a falar: “Não se deve mudar time que está ganhando”, mas, eventualmente, o time precisa mudar para ganhar mais, para se renovar. Nem sempre é fácil convencer as pessoas de que mudanças podem ser salutares.
Terceiro, a comunidade precisa entender as mudanças. Muitas vezes as mudanças estão claras na mente daquele que a propõe, mas ainda não foram consolidadas e entendidas pela maioria das pessoas. O grande problema nesta situação tem a ver com a comunicação. Nem sempre as pessoas estão entendendo o que estamos falando. Um projeto bem feito, uma visão bem transmitida, é o grande desafio de qualquer liderança.
Quarto, num dos Congressos recentes que participei, o Pr. Sérgio Queiroz, da “Cidade Viva”, em João Pessoa-PB, surpreendeu a todos os congressistas com a afirmação: “Leve seus líderes para passear”. Muitas vezes os lideres viveram a vida inteira em torno de um único conceito, e não conseguem ter uma ideia mais ampla, nem visualizar o que pode acontecer com o potencial que a igreja tem nas mãos. Não é maldade, é desconhecimento. Conversar com outras pessoas, trocar experiências, ouvir pessoas sinceras falando de projetos desafiadores e princípios que podem ser aplicados, abre a visão e projeta positivas transformações. Leve seus líderes para encontros e eventos onde terão oportunidade de ouvir novas abordagens, isto facilita o processo.
Quinto, o Pr. James Meeks, da Salem Baptist Church em Chicago, deu uma boa dica de como fazer isto: “Não dê anúncios, mas pregue anúncios!”. A tese dele é que os projetos da igreja precisam ser teologicamente fundados. Muitas pessoas ao verem o projeto pode acreditar que ele não apenas não pode ser aplicado, mas que conspira contra a Bíblia e por conseguinte, herético. Então, se as pessoas não entenderem biblicamente as mudanças, não terão interesse em aplicar tais métodos à vida da igreja. Isto é importante para nós também, que desejamos liderar projetos. O que estamos querendo fazer encontra suporte na teologia bíblica e reformada? A visão não é contrária ao pensamento das Escrituras? Deus aprova o que fazemos?
Mudanças são necessárias e nos desafiam. Pessoas precisam de mudança, famílias precisam mudar, igrejas precisam atualizar sua abordagem quanto ao estilo, contexto histórico e missões. Não transforme a mudança num problema que roube sua paz, nem desista de realizá-las. Temor a Deus, sabedoria, respeito às pessoas, preparação e comunicação são essenciais neste processo. Não é preciso nem necessário orar para que as pessoas resistentes às mudanças sejam promovidas para a glória. Eventualmente as pessoas mais resistentes, quando entendem as melhorias que as mudanças trarão, podem se transformar em grandes aliados dos projetos.
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