Crises
e alternativas
Uma
análise de Plantação de Igrejas na IPB
Estudo
de caso
Rev Samuel
Vieira
Introdução:
O Censo da Igreja Presbiteriana do
Brasil (2008), foi publicado em parceria com o Ministério de Apoio com
Informação e em colaboração com a Secretaria Executiva da IPB foi o primeiro
levantamento denominacional protestante evangélico do Brasil, e, considerando a
presença dos presbiterianos em solo brasileiro por mais de 150 anos, e com
aproximadamente 750 mil membros, torna-se um documento interessante para análise de crises e as alternativas sobre o
grande desafio de plantar igrejas.
Como ponto de partida, podemos dizer que
apesar de estarmos usando os números desta denominação, esperamos tirar algumas
lições de forma mais global, já que as mesmas contingências podem ser
aplicáveis também à realidade de outras igrejas no Brasil, e aponte novas
oportunidades e estratégias para quem deseja estudar o assunto.
A pesquisa reuniu uma amostragem de
1.273 igrejas, e o questionário é composto por 36 perguntas de interesse real e
3 perguntas de identificação, que vão desde cadastro, formação das igrejas, rol
de membros e freqüência a atividades. Apesar das variáveis que uma pesquisa
como esta pode apresentar, é muito significativo trabalhar com os dados para que uma reflexão mais madura possa
ser realizada.
Gráfico
1:
Este gráfico nos ajuda a perceber como
estão distribuídos os membros de igrejas em nossa nação. Como era de se
esperar, o número de membros de igrejas pentecostais e neo-pentecostais atinge
os 70%, com 26% de evangélicos históricos e 5% de outras evangélicas, que
talvez seja uma referência a igrejas que são consideradas como seitas por
alguns (Adventistas e Congregação Cristã do Brasil), e talvez cite até seitas
que são classificadas em muitos meios midiáticos seculares como evangélicas
(Mórmons e Testemunhas de Jeová).
Gráfico
2:
Também não apresenta surpresas, uma vez
que a tendência de migração sempre foi da zona rural para a cidade. Estes
números nos mostram:
·
Estes dados apontam para a necessidade de uma pastoral
urbana adequada. Comblin indaga sobre
este não falar acerca da missão urbana: “o
que está por detrás do silencio teológico sobre a cidade?”. “A Igreja é
chamada a assumir a sociedade urbana, não por oportunismo religioso, mas por
vocação (...) Seu papel consiste em criar o povo de Deus a partir da cidade”. [1]
·
A necessidade de termos uma
“Teologia da Cidade”: Outra questão pastoral pode ser aqui levantada: Como a cidade pode
encarnar tanto assim o paganismo e se tornar tão oposta a Deus e ao seu
conteúdo revelativo? Por que as cidades chegam a ser como são, fonte de
hostilidade, luxúria e oposição a tudo o que é divino? Os profetas estão sempre
condenando a impiedade e a idolatria das cidades, mas a igreja urbana hoje muitas
vezes tem dificuldade de entender as teias e amarras que unem e dividem a polis.
·
Ray Bakke afirma
que nosso problema é que temos vivido na cidade, com sociologia e ferramentas
urbanas, mas com teologia rural, e, na sua opinião, precisamos de uma teologia
tão grande quanto a nossa cidade, tão urbana quanto nossa sociologia e
missiologia.
·
O desafio de se construir uma Teologia da Cidade. Apesar de mais de 90% das
igrejas se encontrarem em zona urbana, há uma tendência de seguir uma estrutura
rural, e por conseguinte, com dificuldades para interpretar os fenômenos e
tendências modernas, aplicando o conteúdo do Evangelho com metodologia e
instrumentais adequados. A sugestão de Linthicum é, portanto, mais que
apropriada: "Tenha uma teologia tão grande quanto o tamanho da cidade e um
ministério tal especifico como a próxima pessoa que você encontrar". [2]
A verdade é que, “hoje, como há seis mil
anos, a civilização vai da cidade ao campo, e nunca o inverso”.[3]
Apesar da relevância da cidade vemos um profundo descaso da igreja em relação
às suas necessidades. Apenas recentemente, iniciou-se uma séria discussão sobre
o papel da Igreja no contexto urbano. O resultado disto é que a cidade foi
abandonada à sua própria sorte, as igrejas simplesmente não sabem o que fazer
com as necessidades urbanas e ainda continuam reproduzindo o mesmo modelo
pastoral da zona rural, revelando um profundo despreparo frente aos desafios
que a cidade trazia à igreja.
Comblin questiona como a teologia pode permanecer
indiferente diante desta realidade humana. “A ausência de uma pastoral firme
frente à cidade, pode ser reflexo de ausência de pensamento… Podemos
legitimamente nos perguntar se a anarquia atual da pastoral das grandes cidades
não está unida a uma ausência da teologia da cidade, que se encontra implícita
nas fontes da revelação e, entretanto, não teve a explicação necessária. A
igreja da Europa Ocidental é rural em todas as suas estruturas fundamentais”...
As paróquias urbanas não passam de paróquias rurais trasladadas à cidade[4]
Este gráfico nos desafia a pensar igrejas com
categorias de urbanidade, e isto nem sempre é possível por causa da própria
formação de nossos seminários que tende a perpetuar uma linha de pensamento
menos dialética que esteve sempre presente nos contextos rurais que marcaram
tanto a liturgia e a teologia da igreja durante muitas décadas.
Gráfico 3:
Neste gráfico entramos propriamente na discussão sobre
plantação de igrejas.
Os números impressionam e geram certa inquietação. 45%
das igrejas não têm congregação nem ponto de pregação, isto é, não possuem
nenhum projeto a curto ou médio prazo para uma nova igreja. Outro número que
chama a nossa atenção refere-se aos que deixaram de responder ao questionário.
Tenho a tendência de achar que quem está fazendo um bom trabalho gosta de
declarar que o faz, e não omitir, e isto me leva a perguntar. Será que os 18% que
se omitiram na resposta, não o fizeram por não possuirem frentes missionárias?
Isto elevaria o número para 63%, embora o próximo gráfico apresente uma pequena
diferença, acredito que estatisticamente ela não faz tanta diferença.
Uma pergunta que pode ser levantada aqui é por que
igrejas não estão plantando novas igrejas ou estão despreocupadas com esta
tarefa? Uma igreja saudável tende a expandir-se, como todos organismos vivos o
fazem. Igrejas plantam igrejas! Isto pode não estar acontecendo por causa de
uma teologia equivocada ou deficiente, por miopia de visão ou talvez porque já
tentaram e tiverem pífios resultados. Justifica-se naturalmente, as pequenas
igrejas recém organizadas, que estão ainda dando seus primeiros passos e que
não tiveram ainda condições de pensar na expansão de si mesmas, mas espera-se
que este processo não seja longo demais. Uma congregação numa cidade
estratégica do Nordeste do Brasil levou 76 anos para organizar-se.
Seja como for, é ainda desafiador
imaginar uma igreja que não está avançando para criar novas frentes, já que se
sabe que o custo de um ponto de pregação é quase inexistente, e os próprios
leigos de uma comunidade, somando-se aos esforços de um pastor local serão
capazes de realizar a tarefa.
Gráfico
4
Este quadro é sugestivo porque faz uma
amostragem por décadas. Como podemos observar, poucas eram as igrejas que não
tinham congregações, os números são quase iguais de 1931 a1990, mas nesta década,
inexplicavelmente, o número deu um salto, saindo de 27% para 38%, um aumento de
11%. Os dados tornam-se ainda mais significativos entre 2000-2008, quando subiu
para 53%, num aumento de 15%. Se considerarmos as últimas duas décadas, 26% de
igrejas perderam a capacidade de olhar para outros campos e tentar estabelecer
novas comunidades. Presbitérios e sínodos deveriam considerar com muita
seriedade estes números e discutir os motivos detrás da inércia, tentando
reverter estes números para patamares suportáveis, que seriam em torno de 25%.
Existem atualmente muitas igrejas sem
uma proposta de evangelização ou abertura de novos campos. Se considerarmos que
“Plantar igrejas é o método mais eficaz de evangelização”, como afirma Peter
Wagner, nossa dimensão evangelística precisa ser reavaliada imediatamente.
Gráfico
5:
Este gráfico fala de igrejas que já
puderam em sua história, ver uma de suas congregações se tornando independente
em termos de liderança e finanças. Igrejas filhas são aquelas que já foram
organizadas e tem vida própria. Considerando que 76% não possuem nenhuma filha,
temos um problema sério de úteros estéreis, já que o número de novas igrejas
avançou significativamente no contexto brasileiro, isto nos leva a dizer que
apenas 24% das igrejas plantaram todas as demais. Indica ainda que se trata de
uma questão de visão e teologia de missões. Algumas igrejas estão sendo
biblicamente orientadas, enquanto outras se encontram descuidadas sobre este assunto
e precisam envidar esforços para quebrar a lei da inércia que as tem
imobilizado de forma tão negativa. Muitas igrejas ainda não tiveram o privilégio
de ver outras igrejas se organizando por seu esforço missionário.
Gráfico
6:
Este quadro mostra de onde surgem os
novos membros das igrejas.
28
% nascidos na IPB local – isto é, boa parte do crescimento é vegetativo.
Pode parecer negativo, mas considero tais números importantes, porque
lamentavelmente muitas igrejas não conseguem sequer manter o seu número de
membros, e se conseguissem manter os filhos, o número de membros já seria bem
superior ao que existe. Além do mais, uma das grandes bençãos que temos é
perceber que os filhos estão permanecendo na igreja, isto mostra que a fé dos
pais de alguma forma está sendo comunicado à próxima geração. Quando a fé deixa
de ser comunicada de forma eficiente, os filhos perdem o interesse pelo
evangelho e pela vida cristã e se afastam do caminho do Senhor. As duas maiores
fontes de apostasia são: (a)- Liderança inescrupulosa e infiel; (b)- Pais
cínicos e indiferentes. Filhos se apostatam da fé quando estes elementos estão
presentes.
14% Outra
religião – A mudança de membros de uma comunidade para outra não é muito
rara, numa época em que existe muito pouca “fidelização” doutrinária e menos
ainda, denominacional. Muda-se por razões teológicas, litúrgicas, pessoais, mas
muda-se também por razões geográficas e por adaptabilidade. Na perspectiva do
reino estas mudanças nada dizem, mas, na eclesiologia são eloqüentes. Na linguagem
do Rev. Antonio Elias, “Ovelha vai para onde tem pastor melhor”
31%
Outra religião – Aqui
devemos concentrar todo nosso esforço missionário, e é para onde nossos olhos
devem estar atentos. Afinal de contas, a grande missão da igreja é pregar com
fidelidade a palavra para que aqueles que estão perdidos espiritualmente. “Livra os que estão sendo levados para a
morte e salva os que cambaleiam indo para serem mortos. Se disseres: Não o
soubemos, não o perceberá aquele que pesa os corações? Não o saberá aquele que
atenta para a tua alma? E não pagará ele ao homem segundos as suas obras?”
(Pv 24.11-12).
A igreja deve buscar alternativas
bíblicas criativas para pregar o evangelho. O nosso alvo deve ser o de alcançar
os não alcançados com a mensagem de libertação que o evangelho traz. A única instituição
que não existe com uma finalidade de meramente satisfazer seus membros é a
igreja. Todas entidades filantrópicas bastam a si mesmas, mas a igreja que não
faz missão está perdendo a essência de sua identidade. Nossa missão é fazer
missão.
Os outros números apenas refletem a
realidade natural de pessoas que mudam de igrejas, de presbitérios, de regiões,
etc., são muitos os fatores que provocam estas mudanças, entre eles a
transferência de trabalho, mudança de jovens para estudar em outros lugares,
casamentos e assim por diante.
Conclusão:
Números têm o poder de nos orientar,
chocar e desafiar. Na medida que estudamos estes gráficos, surgem muitas
questões e algumas alternativas:
- Por
que Plantação de Igrejas tem sido tão negligenciada nos últimos 20 anos
como apontam as estatísticas? Mudou o conteúdo da missão? Existem
problemas nos fundamentos teológicos dos seminários? O que levou as
igrejas a perderem seu vigor e agressividade evangelísticas?
- Que
ênfases precisam ser dadas nos próximos anos para que esta curva de nível
retorne a um patamar aceitável, ou pelo menos a números que durante tantos
anos marcaram esta igreja?
- Estes
dados são relativos apenas a Igreja presbiteriana ou se aplicam igualmente
a outras igrejas históricas?
- Como
Sínodos e autarquias das igrejas poderiam se mobilizar em educação
teológica, pregação da palavra, aprofundamento bíblico para que a igreja
desperte para o grande desafio de plantar novas igrejas?
Rev Samuel Vieira
Professor de Plantação de Igrejas
Seminário Presbiteriano Brasil Central-
Goiânia - GO.
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