domingo, 18 de novembro de 2012

EVANGELIZAÇÃO X PREDESTINAÇÃO



Introdução:

Existem alguns temas nas Escrituras que são difíceis de conciliar:

  1. Como o Deus Pai, Filho, Espírito Santo podem ser três pessoas subsistindo em forma de uma só?
  2. Como conciliar a pessoa teantrópica de Cristo. Ao mesmo tempo 100% humano e 100% divino?
  3. Como a responsabilidade humana e a soberania de Deus podem andar juntas?
  4. Se Deus sabe de todas as coisas antes que a peçamos, por que pedir, e ainda mais difícil: Se oração não muda o coração de Deus, por que orar?

No Livro: Evangelização e soberania de Deus, J.I. PACKER[1], o autor procura tratar destas questões. Se Deus controla todas as coisas, por que evangelizar? A soberania de Deus enfraquece a Evangelização?  Há contradição entre Predestinação e Evangelização?

Para Packer, trata-se de um antinômio da revelação de Deus contida na Bíblia. Um antinômio não é um paradoxo, mas “Uma contradição entre conclusões que parecem igualmente lógicas, razoáveis, ou necessárias”. Naturalmente trata-se de uma contradição aparente, e há razões para se crer tanto numa quanto na outra. No paradoxo, não são os fatos que dão idéia de contradição, mas as palavras.

Eis alguns exemplos de paradoxos:

               “Sou livre, quando sou escravo”

               “Entristecidos, mas sempre alegres”

               “Nada tendo, mas possuindo tudo”.

Nestes casos, diz Packer, a contradição é verbal, não real. Isto é paradoxo.

No antinômio, precisamos aceitá-lo como ele é, e aprender a viver com ele. É algo que não compreendemos no presente, mas que são complementares.

Por exemplo, na física escalada, 1 + 1+ 1= 3, mas nos números vetoriais, o resultado pode ser 1. Quando falamos de paralelas, pensamos em duas linhas retas que andam juntas e nunca se tocam, mas quando vamos para física quântica sabemos as paralelas se tocam no infinito.

Considere, portanto, dois atributos de Deus: Ele é ao mesmo tempo juiz e rei. Como juiz, o ser humano torna-se responsável pelas escolhas morais que faz e é julgado por elas. Como rei, Deus é soberano: Ele ordena, governa e controla todas as coisas, e nada acontece sem sua ordem, inclusive no plano da salvação, já que ele escolhe e predestina para a salvação.

A Bíblia trata as duas coisas de forma simultânea, sem nenhuma crise. Se o homem não reconhecer o Jesus como Filho de Deus, Salvador, está eternamente perdido (Jo 3.18), mas ao mesmo tempo a Palavra de Deus nos afirma que são salvos todos aqueles que foram “destinados à vida eterna” (At 13.48). No entanto, precisamos manter com igual ênfase as duas verdades aparentemente conflitantes. Deus é juiz soberano, as pessoas serão condenadas se não obedecerem ao que Ele diz. Serão condenadas porque rejeitaram a salvação, por meio de Jesus, que Ele nos ofereceu.

Em Rm 9, vemos um tratado tremendo sobre os “decretus horribilis”, Paulo afirma que não depende de quem quer, nem de quem corre, mas de Deus usar sua misericórdia. (Rm 9.16) Afirma ainda que Deus odiou Esaú, antes dele ter nascido, “para que, o propósito de Deus quanto à eleição, prevalecesse” (Rm 9.11). Estas afirmações são fortes e soam agressivas para o homem. No entanto, quando entramos no capítulo 10, o mesmo Paulo que fala tão seriamente da escolha de Deus, está orando pela conversão dos judeus (Rm 10.1), e afirma que é necessário pregar, pois sem a pregação do Evangelho, o homem não pode se converter e ser salvo. Por isto é necessário pregar (Rm 10.11-14).

Você crê na soberania de Deus? Packer afirma que cremos, por duas razões:

1. Deus é soberano no mundo por ele criado. É por isso que oramos porque sabemos que Deus é soberano. Se não entendermos que Deus controla todas as coisas, não faz sentido orar.

2. Deus é soberano na salvação.

a. Você dá graças por sua salvação?

b. Você ora pela salvação dos outros?

Estas duas atitudes naturais do homem de fé indicam que de fato cremos que Deus é soberano. Deus é soberano no mundo por ele criado, por isso oramos. Deus é soberano na salvação, por isto agradecemos a salvação.

Packer adverte, que existem dois perigos quando não consideramos estes dois lados da questão:

1 – Preocupação exclusiva com a responsabilidade humana – Afirmamos que os homens são responsáveis e nos esquecemos que o homem sem Cristo está morto, incapaz de se inclinar para Deus, e que somente com o toque do Espírito Santo ele poderá se voltar a Deus. E somente através da graça de Deus ele poderá reviver espiritualmente. Precisamos sempre lembrar que usamos nossos dons e talentos, evangelizamos, mas somos apenas instrumentos:

At 13.48;

2Tm 2.10;

Tt 1.1;

Quando só olhamos para a responsabilidade humana, nos esquecermos de que é Deus quem faz, e deixamos de glorificá-lo. Podemos usar todos os meios para convencer pessoas a se renderem a Cristo, como Paulo faz em 1 Co 9.19-23, mas na evangelização, precisamos entender que a soberania de Deus deve nos orientar no planejamento, oração e na ação.

Podemos chamar este risco de “Antropocentrismo Arminiano”, por colocar a ênfase na ação do homem, tirando a glória de Deus.

2 – Preocupação exclusiva com a soberania de Deus.  Os resultados negativos surgem imediatamente:

·        Enfraquecimento da oração – Se Deus é quem faz, por que orar?

·        Perda do impulso evangelístico – Não sinto a responsabilidade de pregar

·        Perda da sensibilidade com o próximo -  Não me aproximo do pecador para lhe compartilhar as boas novas. Torno-me passível em relação ao mandato missionário.

Ilustração I: Certo fazendeiro calvinista se aproximou do seu vizinho metodista, que estava com uma lavoura muito bonita e lhe disse: “É meu irmão, Deus é realmente soberano e bom, veja como está sua plantação. A soja está bonita... Deus manda chuva no tempo certo e controla todas as coisas”. O arminiano respondeu: “É... eu sei que Deus é bom, mas não fosse a gente arrancar o mato, tirar os cupins, semear a cultivar a semente, acho que não teríamos esta lavoura bonita que temos aqui...” A preocupação exclusiva com a soberania de Deus, não traduz a mentalidade apostólica e bíblica.

Ilustração II: Dois séculos atrás, Willian Carey procurou o diretor da fraternidade de ministros da Inglaterra para falar do seu chamado missionário. A resposta foi: “Quando Deus quiser converter os pagãos, ele o fará sem a sua ajuda ou a minha”.

O calvinismo fatalista, não leva em consideração todos os lados da salvação, que inclui a eleição divina e a responsabilidade humana.

Como corrigir estas distorções?

A prevenção se dá quando cremos nas duas doutrinas e a mantemos diante de nós, igual e constantemente enfatizadas, para orientação e governo de nossas vidas.

Fl 2.12.14 é um texto que pode ser usado para nos esclarecer.

Ele nos desafia a “desenvolver nossa salvação”, e isto parece indicar uma ação humana. Mas ao mesmo tempo afirma que “Deus é quem efetua em nós tanto o querer (vontade), como o realizar (prática)”. Isto se refere á operação de Deus. Ele age na salvação e na santificação, mas a responsabilidade do versículo 12 recai, aparentemente, no homem. Nós precisamos usar com igual ênfase as duas verdades aparentemente conflitantes.

Perguntaram a C. H. Spurgeon. “como o Senhor seria capaz de reconciliar estas duas verdades?, e ele respondeu: “- Nunca! Elas não são inimigas e eu não preciso reconciliar amigos”.

Packer elabora algumas proposições, negativas e positivas|:


Quatro proposições negativas:


1.      A graça de Deus, soberana, não compromete nada sobre a natureza da evangelização.  Evangelizar é necessário. Nenhum ser humano pode ser salvo sem evangelização. (Rm 10.9-12). Quando Deus nos envia para pregar isto faz parte do seu propósito e estratégia para salvar a humanidade. Jesus cria na soberania de Deus, e pregava a salvação.


2.      A crença de que Deus é soberano, não afeta a urgência da evangelização. Sem Jesus, o homem sem Deus está perdido e só lhe resta a condenação e o inferno. “Os campos estão brancos” – é tempo de colheita!


3.      A crença na soberania não afeta a sinceridade do apelo. Nós não somos hipócritas, mesmo quando sabemos que salvação é obra de Deus no coração do pecador e apelamos por sua conversão. “Todo aquele que invocar o nome do Senhor, será salvo” (Rm 10.13), e o método de Deus é usar seus servos: “Como crerão se não há quem pregue?”.


4.      A crença na soberania não afeta a responsabilidade do pecador. Em toda Escritura vemos que homem está perdido se rejeitar a salvação. Ez 18.31; Jo 3.19; 5.40. Hb 2.3: “Como escaparemos se negligenciarmos tão grande salvação?”


Proposição Positiva:


1.      A soberania nos fornece a única esperança de sucesso na Evangelização.  Por que haverá colheitas? Porque há eleitos. O homem carnal, sem a operação do Espírito Santo, não pode entender, nem aceitar as coisas do Espírito. Será que, através da oratória, podemos ressuscitar o homem que está morto em seus delitos e pecados? Como empreendimento humano, a tarefa da evangelização é impossível. Fé é dom de Deus (Ef 2.8-9; At 11.18; 18.9; Jo 6.44)

Ao evangelizarmos, cremos na Chamada Eficaz que o Espírito Santo faz ao pecador. Por isto pregamos nesta promessa de Deus. Esta proposição gera três efeitos em nossas vidas

a.      Nos torna ousados – O homem mais empedernido, ao ser tocado pelo Espírito Santo, se eleito, responderá a este maravilhoso chamado que Deus lhe faz. Portanto, nenhum homem, por mais distante que pareça, não pode ser alcançado pela graça de Deus. A graça de Deus pode salvar qualquer homem em qualquer circunstância.

b.      Nos torna pacientes – Deus salva a seu tempo. Enquanto isto, semeamos com lágrimas e oramos pelos pecadores (Rm 10.1).

c.      Nos torna homens de oração – Oração é a confissão de nossa impotência e necessidade (2 Ts 3.1). Pregação e oração devem andar juntas.



Conclusão:

Perguntaram a Adoniram Judson, numa das masmorras da antiga Birmânia (atual Mianmar), quais as possibilidades do evangelho fazer qualquer diferença na vida dos homens pecadores e depravados, e elas se converterem? Sua resposta foi: “As possibilidades são tão grande quanto as promessas de Deus”. 

Questões para discussão:   

1.       1. A partir do texto, levante três questões dialéticas que desafia o pensar teológico quando se trata da evangelização e predestinação;

2.    2.    Quais os riscos para a igreja com o hiper-calvinismo e quais os efeitos teológicos quando se nega a eleição incondicional?

3.       Que aplicações práticas você  pode extrair, a partir da leitura, para sua vida e para seu ministério?                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                            






[1] J.I. PACKER - Evangelização e soberania de Deus, São Paulo, Casa de Cultura Cristã, 2003.

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